No Brasil, o AVC é a segunda principal causa de morte, com 68 mil óbitos por ano
shutterstock/Reprodução
No Brasil, o AVC é a segunda principal causa de morte, com 68 mil óbitos por ano

Não existe hora, local e nem idade. Os sintomas podem ser silenciosos e traiçoeiros. Talvez a pessoa nem saiba, mas aquela perda temporária da visão que ela sofreu por alguns minutos e depois voltou ao normal, do nada, tenha sido um indício de que ela estava tendo um acidente vascular cerebral (AVC).

Leia também: 10 sinais de que você pode estar sofrendo um AVC

Apesar de muito comum, com cerca de 17 milhões de casos por ano no mundo todo, o índice de mortalidade do AVC também é extremamente alto, correspondendo a 6 milhões de óbitos no âmbito global, com cerca de uma vida perdida a cada cinco minutos no Brasil por conta da condição.

Para reverter esse quadro, a medicina tem investido em tecnologias que sejam capazes de evitar não só a morte, mas também o máximo de sequelas possíveis aos pacientes. Porém, antes de falar sobre os avanços da ciência neurológica em relação a esse assunto, é preciso lembrar que há um fator crucial para o resultado dessas novas medidas: o tempo .

Tempo perdido é sinonimo de vida perdida

Diferente do que muitos imaginam o AVC, ou derrame , como é popularmente chamado, não tem apenas a paralisação facial e a dificuldade na fala como sintomas principais. Muitos casos podem acontecer com o surgimento de dormência nos braços, fraqueza muscular em apenas um dos lados do corpo ou até mesmo confusão mental, que podem desaparecer com o tempo. E é por conta da falta de clareza nos avisos do organismo e, às vezes por falta de informação, que muitas pessoas acabam demorando a buscar ajuda médica.

Essa espera colabora diretamente para que o paciente tenha sequelas muito sérias, que podem causar algum tipo de dependência funcional ou até o óbito. “Quanto mais tempo se perde desde que os primeiros sintomas são identificados até o paciente chegar a uma emergência, menor é a capacidade dele de se recuperar”, explica o neuroradiologista do Hospital das Américas, do Rio de Janeiro, Eduardo Wajnberg, especialista em Radiologia e Diagnóstico por Imagem, Radiologia Intervencionista e Cirurgia Endovascular.

O procedimento padrão para o tratamento dessa doença depende quase que totalmente do intervalo entre os primeiros sinais e a entrada do indivíduo no emergência médica. Isso porque 80% dos casos de acidente vascular cerebral são do tipo isquêmicos - quando há uma obstrução no fluxo sanguíneo de uma artéria, que é responsável por levar o sangue do coração ao cérebro – e, para cuidar de um paciente com essa condição, o mais comum é através de trombolíticos, que são medicamentos capazes de dissolver o coagulo que está impedindo a passagem sanguínea.

O problema é que esses medicamentos só conseguem ser eficazes após, no máximo, três horas depois que a pessoa sofreu o AVC. “E isso é muito raro. Apenas 0,5% dos pacientes chegam aos hospitais até três horas do início dos sintomas”, explica Wajnberg.

Pensando nisso, cientistas de todo o mundo passaram anos tentando encontrar um mecanismo que fosse mais eficiente na recuperação de pacientes que sofreram derrames, e que pudesse prolongar o tempo depois que os primeiros sinais da doença aparecessem para a eficácia do tratamento.

Até que, em 2015, período intitulado de “primavera neurológica”, os primeiros estudos que envolviam um procedimento conhecido como “ trombectomia mecânica ” começou a ter bons resultados para esse fim, e atualmente é a tecnologia mais avançada para esse tipo de doença.

Avanço tecnológico

Depois de muitos estudos e adaptações, o AVC pode ser tratado de maneira menos invasiva com a trombectomia. Essa técnica tem empolgado muito os neurologistas, já que o procedimento tem permitido aumentar o tempo que garante sua eficácia. “Hoje, podemos dizer que, se o paciente for submetido à trombectomia mecânica até 8 horas depois do primeiro sintoma de AVC, as chances de ele ter algum benefício são de 73%”.

Leia também: Dormir mais de 8 horas por noite aumenta chances de derrame em 146%, diz estudo

Além de dar mais tempo ao paciente para se dirigir a uma unidade de saúde, esse mecanismo possibilita uma recuperação mais completa, garantindo benefícios que podem ser desde a melhora da visão comprometida pelo AVC, ou melhora da capacidade motora, até a recuperação total do indivíduo.

De acordo com o neurologista , novas pesquisas feitas por cientistas europeus já conseguiram comprovar que a técnica poderá prolongar esse tempo ainda mais, dando até 24 horas para o paciente ter a chance de ser tratado. “Isso é muito empolgante. Em pensar que até dois anos atrás esse tipo de avanço não era possível, 24 horas é muito tempo”, afirmou o médico.

No entanto, esse tipo de mecanismo só está disponível na rede privada de saúde. “É uma pena, porque não temos esse procedimento ainda no Sistema Único de Saúde. No entanto, há esforços para que isso ocorra, já que, do ponto de vista econômico, é muito mais rentável o uso da trombectomia mecânica, em comparação com os gastos com um paciente que teve AVC dará ao governo com medicamentos, exames, fisioterapias e etc.”.

 Impacto econômico

Para entender como seria possível poupar verba, a gerente de economia da saúde e acesso ao mercado da Johnson & Johnson Medical Devices Fernanda Oliveira explica que o atual tratamento feito na rede pública de saúde não está “levando saúde”. “A média de tempo que um paciente leva desde o primeiro sintoma do AVC até buscar ajuda médica é de 13 horas. Isso significa que os trombolíticos não vão funcionar, e que o governo está investindo em um recurso que não está surtindo efeito”, destaca ela.

Fernanda também ressalta que os gastos com pacientes que sofreram AVC são em torno de R$ 50 milhões. “Incluindo os custos com internações, exames, medicamentos e outros cuidados, já que muitos ficam com alguma incapacidade e cerca de 60% precisam ser reinternados”.

Atualmente, a Codman Neuro, marca da Johnson & Johnson Medical Devices, produz um dispositivo que é utilizado na trombectomia mecânica, o ReVive SE. Esse equipamento é usado para retirar o coágulo formado na artéria. De uso individual, cada uma dessas peças custa em torno de R$ 15 mil. “Mas isso não é um problema para as operadoras de saúde, que reembolsam esse valor e nada é repassado para o paciente. Os convênios entendem que esse custo é pequeno perto do montante gasto com o indivíduo com tratamentos que não vão funcionar”, esclarece o gerente de produto da Codman Neuro Octávio Ferraz.

Dispositivo usado para retirar o coágulo da artéria obstruída; a
Divulgação
Dispositivo usado para retirar o coágulo da artéria obstruída; a "gaiola" captura o trombo e retira pelo cateter

Enquanto as autoridades da saúde pública ainda não decidem por essa alternativa, a luta contra o tempo continua. É importante que os pacientes continuem, cada vez mais, atentos aos sinais que o corpo pode dar, principalmente, pessoas que possuem algum fator de risco, como obesidade, tabagismo ou histórico familiar. A qualquer sinal que possa caracterizar um AVC, é imprescindível que o indivíduo seja encaminhado ao hospital o mais urgente possível.

Leia também: "Achei que era só um formigamento no braço  e quando vi tinha sofrido um AVC"

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!