A corrida mundial pela vacina para conter a varíola dos macacos; Brasil está atrasado, entenda
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A corrida mundial pela vacina para conter a varíola dos macacos; Brasil está atrasado, entenda

À medida que o surto de varíola dos macacos avança pelo mundo, governos de alguns países começaram a oferecer vacinas para os cidadãos mais expostos. Outros estão correndo para avaliar as reservas de imunizantes e tratamentos. Segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO, o Brasil não tem doses armazenadas nem produção nacional, caso seja necessária uma estratégia de imunização.

Quase 20 países já relataram registros da doença causada pelo vírus monkeypox, que é endêmica na África. São mais de 250 infecções confirmadas ou suspeitas, a maioria delas na Europa. Mas também há casos na Austrália, em Israel, Estados Unidos, Canadá e Argentina. Não existe uma vacina específica para o agente infeccioso, mas, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os imunizantes usados para erradicar a varíola humana são até 85% eficazes contra a doença.

"Ter estoque estratégico de algumas vacinas, como varíola e encefalite japonesa é essencialm mas o Ministério da Saúde não tem. Tambérm não temos produção da vacina contra varíola e não sei se conseguiríamos comprar. Agora já talvez seja tarde. O planejamento envolve um passo anterior. EUA e Europa, por exemplo, compraram um lote bem grande", diz o infectologista Julio Croda, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT).

Nos EUA, uma vacina da empresa dinamarquesa Bavarian Nordic foi aprovada em 2019 para prevenir tanto a varíola quanto a varíola dos macacos. Na Europa, o mesmo imunizante ganhou aval apenas contra a varíola. Mas o uso off label contra o vírus monkeypox está liberado para conter o surto atual.

Os Estados Unidos têm em estoque cerca de mil doses da vacina da Bavarian Nordic, com previsão de ampliar essa quantidade nas próximas semanas, segundo informações do Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC). Há ainda 100 milhões de doses de uma versão mais antiga de vacina contra a varíola. Ela causa mais efeitos colaterais graves, como inflamação do músculo cardíaco, e não pode ser usada em alguns grupos, como pessoas com eczema.

Inicialmente, a distribuição das vacinas no país será destinada a quem tem maior risco de infecção, como pessoas que tiveram contato com infectados e profissionais de saúde. O Reino Unido também está oferecendo o imunizante contra a varíola às equipes de saúde e cidadãos expostos à doença após contato com pacientes contaminados.

O governo da França recomendou o início da vacinação de adultos em risco e profissionais de saúde que estiveram em contato com pacientes infectados. A Alemanha já encomendou 40 mil doses da vacina da Bavarian Nordic, caso seja necessário iniciar uma campanha.

A empresa dinamarquesa tem uma capacidade de produzir 30 milhões de doses de vacina por ano. A farmacêutica recebeu encomendas que variam de algumas centenas a milhares de doses, mas afirma que não há necessidade de expandir a produção. A americana Moderna Inc, que produz uma vacina de mRNA contra o coronavírus, anunciou o início de testes pré-clínicos de potenciais imunizantes contra o vírus monkeypox.

Apesar da mobilização, a OMS afirma que o surto não requer vacinação em massa porque medidas como rastreamento, isolamento de contatos, higiene e comportamento sexual seguro ajudarão a controlar a propagação da doença no mundo.

Casos leves

O infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), concorda com a posição da OMS. Ele explica que para definir uma estratégia de vacinação é preciso conhecer melhor a doença e ainda existem mais perguntas do que respostas sobre o que está motivando o surto atual. Além disso, todos os casos confirmados até o momento foram leves.

"É preciso entender melhor a dimensão desse surto e a forma de transmissão da doença. A OMS está certa para dizer que não há recomendação de vacinação em massa neste momento. É muito desconhecimento para definir qualquer campanha", diz o médico.

O mais provável é que autoridades de saúde recomendem a chamada vacinação em anel, que consiste em rastrear e imunizar todos os contactantes diretos de um caso confirmado, na tentativa de suprimir a disseminação da doença. É o que já está acontecendo na maioria dos países que autorizou o uso da vacina.

De acordo com o infectologista Julio Croda, a vacinação pós-exposição é eficaz se realizada até quatro dias após o contato. Na França, a recomendação é administrar a vacina idealmente dentro de quatro dias. Mas ela pode ser usada até 14 dias após a exposição. Autoridades de saúde da Dinamarca, que também anunciou a adoção da estratégia, dizem que a vacinação pós-exposição pode ajudar a evitar a evolução para casos graves.

Diante disso, Croda acredita que seria importante o Ministério da Saúde ter ao menos um pequeno estoque da vacina para administrar em profissionais de saúde que realizarem o atendimento de casos suspeitos. Procurada pelo GLOBO sobre uma possível compra, a pasta não respondeu até o fechamento desta reportagem.

A Bavarian Nordic, empresa que produz a vacina mais moderna contra a doença, tem uma capacidade de produção anual de 30 milhões de doses de vacina. A empresa disse que recebeu pedidos que variam de algumas centenas a vários milhares de doses, mas afirma que não há necessidade de expandir a produção. A empresa americana Moderna Inc, que produz uma vacina de mRNA contra o coronavírus, anunciou o início de testes pré-clínicos de potenciais vacinas contra a varíola dos macacos.

O grande mistério é que não está claro o que está causando o surto global atual. Segundo Kfouri, a forma mais comum de transmissão da doença é de animais para humanos.

"A comunidade científica foi pega de surpresa porque raramente havia transmissão significativa entre humanos. A transmissão é mais comum e mais fácil de animal para humano", explica o infectologista.

Os cientistas tentando entender a origem dos casos e se algo sobre o vírus mudou. Kfouri acredita que as próximas semanas serão cruciais para termos essas respostas. Mas, a princípio, não há evidências de que o vírus tenha sofrido mutação. Ao contrário do coronavírus, que é baseado em RNA e tem mutação rápida, a varíola do macaco é um grande vírus de DNA capaz de corrigir seus erros genéticos.

O que chama a atenção no surto atual é que muitas das pessoas que foram diagnosticadas são homens que fazem sexo com homens. O que alertou para a possibilidade de transmissão sexual, que não era muito considerada até então.


A varíola dos macacos é uma doença viral geralmente leve, caracterizada por sintomas de febre, bem como uma erupção cutânea distinta. Existem duas cepas principais: a cepa do Congo, que é mais grave – com até 10% de mortalidade – e a cepa da África Ocidental, que tem uma taxa de mortalidade de cerca de 1%. Os casos sequenciados até o momento estão associados à cepa mais leve.

Varíola dos macacos

Identificada pela primeira vez em macacos, a doença viral geralmente se espalha por contato próximo e ocorre em grande parte na África Ocidental e Central. O vírus ainda pode se espalhar por contato físico ou roupas de cama, roupas ou outros materiais contaminados.

Uma semana a duas semanas após a exposição, os infectados podem começar a sentir febre, dor de garganta, tosse, fadiga e dores no corpo. Há também o aparecimento de erupções cutâneas que formam bolhas, crescem e se enchem de uma substância branca semelhante a pus. Essas pústulas lembram a característica mais marcante da varíola. Em geral, elas duram cerca de uma semana antes de cicatrizarem. As pessoas infectadas devem permanecer isoladas em casa e abster-se de atividade sexual até que essas feridas desapareçam.

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