Especialista: Alto número de mortes impede que covid se torne endemia

Ministro da Saúde sinalizou que quer reclassificar covid-19 no Brasil

Uso de máscaras ainda é indispensável em todo o país
Foto: Governo do Estado de São Paulo
Uso de máscaras ainda é indispensável em todo o país

Sem especificar critérios ou quando a medida deve entrar em vigor, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou na terça-feira (22) que a pasta pode reclassificar a covid-19 de pandemia para endemia em breve.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a pandemia é uma doença de nível mundial, que já se disseminou em diversos países e continentes. Já a endemia é recorrente em uma só região, sem um aumento significativo no número de casos, permitindo que a população conviva com ela. Um bom exemplo desse tipo de doença no Brasil é a dengue.

Se confirmada, a decisão pode ser um equívoco, segundo avaliação do Dr. Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

"Uma doença deixa de ser pandêmica quando você tem, não o desaparecimento, mas uma letalidade muito baixa, seja pela vacina, pela mudança no vírus ou por ter infectado muita gente. Nenhuma doença com 800 mortes por dia pode ser cogitada como endêmica - e é isso que o Brasil registra diariamente", explica.

O especialista aponta também que essas reclassificações devem ser feitas pela OMS, e não por cada país, isoladamente, como o ministro deu a entender.

"[Um país] Pode classificar [uma doença] como emergência de saúde ou não, mas quem declara a pandemia ou suspende a pandemia é a OMS, ou somente ela."

O ministro Queiroga afirmou que a reclassificação vai depender de fatores epidemiológicos, mas não especificou quais, dizendo se tratar de uma "tendecia mundial". A fala ocorreu logo após o Reino Unido anunciar o fim das restrições sanitárias.

De acordo com o Dr. Kfouri, alguns países que já passaram pelo ápice de Ômicron, de fato, abandonaram algumas medidas, e estão vivendo uma "lua de mel" - "um período como o que a gente viveu no final do ano", o que ainda não pode ser considerado um precedente, dado o caráter imprevísivel do vírus.

"Temos meia dúzia de países que passaram pela Ômicron e estão vivendo uma 'lua de mel', um período como o que vivemos no final do ano. Só que existe o fator imprevisibilidade. Do mesmo jeito que surgiu a Ômicron, pode surgir outra, e a gente voltar ao mesmo estágio que estamos hoje, ou até pior", pondera.

"A expectativa, ou o desejo é esse, mas estamos longe de ter indicadores nesse sentido, de que nao vamos ter mais variantes, que pandeima acabou ou que essa será a última onda. É muito mais um desejo do que uma evidência embutida nesse discurso."

Na prática, a mudaça impactaria diretamente na parte burocrática, no que diz respeito a contratações e compras durante o período de emergência em saúde. Mas traria novas regras também para o dia a dia dos brasileiros.

"Claro que tem questões econômicas, de aprovação de verbas, questões legislativas que em situações de emergencia sanitária são relaxadas, como compra de materiais sem licitação.
Impacta também nos mecanismos de intervencao, obrigatoriedade de vacinação, facilitação de verbas, viagens, [encarar como pandemia] favorece o enfrentamento."

** Filha da periferia que nasceu para contar histórias. Denise Bonfim é jornalista e apaixonada por futebol. No iG, escreve sobre saúde, política e cotidiano.