Covid: Casos globais dobram em 2 meses; países evitam novas restrições

Mundo registrou, no domingo (24), média móvel de 1,1 milhão de diagnósticos. Em 24 de julho, esse número era 540 mil

Foto: Pixabay
Números podem ser ainda maiores, uma vez que resultados de autotestes caseiros quase nunca são notificados

É raro ver máscaras nas ruas ou governos debatendo um reforço das medidas de distanciamento social, apesar de os casos mundiais da  Covid-19 terem dobrado nos últimos dois meses, impulsionados pelas novas subvariantes da cepa Ômicron, principalmente a supertransmissível BA.5. E os números reais são ainda maiores, já que o acesso a autotestes caseiros, cujos resultados quase sempre não são notificados, cresce progressivamente.

Não raramente, os sintomas leves ou inexistentes fazem com o que o paciente nem sequer sinta a necessidade de se testar — algo que ocorre principalmente graças à vacinação avançada e à imunidade adquirida em infecções prévias. Segundo dados do Our World in Data, um projeto da Universidade de Oxford, mais de 61% da população global tomou duas doses. Não se sabe ao certo o percentual dos inoculados com doses de reforço, mas estima-se que seja inferior a 30%.

No domingo (24), o mundo registrou uma média móvel de 1,1 milhão de diagnósticos — mais que o dobro dos 540 mil registrados em 24 de julho de 2021 e que os 538,6 contabilizados no dia 24 de maio deste ano. As mortes, contudo, deixam claro que se trata de um novo momento da crise sanitária. Há um ano, o coronavírus tirava diariamente uma média de 8,6 mil vidas. Hoje, as mortes diárias são cerca de 2,6 mil.

Ainda assim, alerta repetidamente a Organização Mundial de Saúde (OMS), é necessário redobrar as atenções. Há apenas um mês, em 24 de junho, o vírus matava menos de 1,5 mil pessoas por dia, e o temor é que o aumento do número de casos e internações signifique uma crise ainda maior quando as temperaturas começarem a cair com o fim do verão boreal, em setembro.

"Países que desmantelaram algumas partes dos seus sistemas de resposta pandêmica estão assumindo um grande risco. Todos os países tem lacunas", disse o diretor-geral da organização, Tedros Adhanom Ghebreyesus, na semana passada. "Agora é a hora, enquanto os hospitais não estão lotados, de todos os países agirem para preencher esta lacuna."

Um dos epicentros globais é a União Europeia, que registrou uma média móvel de 392,9 mil novos casos no sábado, quase o triplo do visto há três meses e um número próximo ao de março deste ano, época da onda causada pela subvariante BA.2. Quatro dos sete países com o maior número de diagnósticos — França, Alemanha, Itália e Grécia — fazem parte do bloco europeu.

Basta olhar para as fotos do verão na costa mediterrânea, contudo, para perceber que não há a mesma preocupação popular ou oficial vista em momentos anteriores da crise de saúde pública. Com 73% da população vacinada, a opção de momento é conviver com o vírus. A muito afetada indústria do turismo se aproveita da alta estação, e os viajantes internacionais vão e vêm em um ritmo não visto desde o começo da pandemia.

Isto ocorre em parte porque as mortes continuam baixas, na casa de 620 por dia. Em fevereiro, o número era superior a 2.150. Em novembro de 2020, chegava perto de 3,6 mil. Os governos rechaçam a ideia de retomar medidas de distanciamento ou passaporte sanitários, focando seus esforços no aumento da testagem e no incentivo à dose de reforço. Até o momento, cerca 53% dos europeus já tomaram ao menos uma injeção adicional.

Após dois anos de crise sanitária, a fadiga é grande e a pandemia é praticamente relegada às notas de rodapé. O noticiário hoje foca em outros assuntos, como as quedas dos governos na Itália e no Reino Unido, a guerra na Ucrânia, que adentra seu sexto mês, e as queimadas maciças nos meses de verão.

O cenário é similar ao dos Estados Unidos, o segundo na lista de países com maior média móvel de novos diagnósticos, ficando atrás apenas do Japão. Em média, 127 mil americanos são infectados e 44 morrem de Covid por dia, aumentos quinzenais de 19% e 38%, respectivamente, segundo dados do New York Times.

Até o próprio presidente Joe Biden contraiu a doença, anunciou a Casa Branca na semana passada. Vacinado e com duas doses de reforço, o democrata tem apenas sintomas leves e se recupera bem.

Mais de três quartos dos casos nos EUA são causados pela BA.5. A subvariante — ou seja, quando há mutações e características diferentes, mas não em volume suficiente para caracterizar uma nova variante — também é a responsável pelo novo surto na Europa. Na semana passada, já causava 53,6% das infecções registradas planeta, segundo a OMS.

Identificada pela primeira vez na África do Sul em fevereiro deste ano, a BA.5 tem apenas seis alterações na sua proteína spike, o que faz com que seja mais contagiosa que todas as outras variações do vírus. Não há indícios, no entanto, de que seja mais letal ou cause sintomas mais graves.

Quarenta e cinco dos 50 estados americanos viram os diagnósticos crescerem na última quinzena. No Colorado, subiram 68%. Na Pensilvânia, 57%. No estado de Nova York, o número de internações é superior ao registrado no pico da variante Delta.

Ao contrário de outros momentos, não há mandatos nacionais para o uso de máscaras e poucos falam em acirrar restrições. Não se houve mais falar em ordens federais para o uso dos protetores faciais ou em disputas judiciais sobre mandatos de vacinação.

A resistência aos inoculantes é particularmente grande em solo americano, onde apenas 67% da população tomou as duas doses — no Brasil, por exemplo, o número se aproxima de 80%. Apenas 32% dos americanos tomaram ao menos uma dose de reforço.

Até mesmo Anthony Fauci, o epidemiologista-chefe da Casa Branca que travou embates com o então presidente Donald Trump devido à resposta anticiência de seu governo à pandemia, disse que "não devemos deixar o vírus interromper nossas vidas". Principal especialista em doenças infecciosas do governo dos EUA sob sete presidentes e quase quatro décadas, ele disse que irá se aposentar no início do ano que vem, antes do mandato do presidente Joe Biden chegar ao fim.

"Mas não podemos negar que é uma realidade com que devemos lidar" completou o médico na semana passada.

O principal responsável pela nova onda é o Japão, onde registrou-se na última quinzena cerca de 150 mil novos diagnósticos diários, um recorde que deixa pressiona o sistema de saúde do país. A maior média, até então, não chegava a 95 mil, em fevereiro desde ano, causada pela Ômicron em sua forma original.

O governo expandiu seu programa de reforço da vacinação e aumentou a distribuição de testes de Covid, mas não toma medidas mais duras. Pelo contrário, relaxou as regras de autoisolamento para os contatos próximos de pessoas diagnosticadas com o vírus, por exemplo.

O surto japonês, apontam as autoridades de saúde local, também é causado pela BA.5 e pela parecida BA.4, outra subvariante que também foi identificada pela primeira vez na África do Sul no início deste ano. Hoje a Covid-19 mata em média 25 pessoas por dia no Japão, uma fração do pico de 260 visto em fevereiro.

O Japão não é uma exceção: o cenário no país se parece com o sul-coreano, onde a média de casos cresceu 257% nas últimas semanas: por dia, em média 65,6 mil pessoas são infectadas, mas a média móvel de mortes é inferior a 20. O país é hoje o sexto do mundo com mais casos, seguido da Grécia e da Austrália.

O país da Oceania registrou nesta segunda-feira um número recorde de novas internações — quase 5,5 mil — devido às novas subvariantes. No sábado (23), também pela primeira vez desde o início da pandemia, as novas mortes ultrapassaram 100 ao dia em meio. A circulação do vírus, alertam as autoridades, é intensificada pelas baixas temperaturas do inverno, e há surtos em asilos e profissionais da saúde.

O governo também estendeu o reforço da vacina para mais grupos e recomenda o trabalho remoto, apesar da decisão final caber às empresas. Na Nova Zelândia, onde o governo da premier Jacinda Ardern insistiu até o fim do ano passado em uma política de "Covid zero", morrem em média 4,37 pessoas para cada milhão de habitantes, a maior taxa do planeta.

As autoridades, contudo, afirmam que máscaras, vacinas e isolamento serão suficientes para dar conta do surto atual, e não cogitam publicamente retornar às quarentenas que vigoraram até o fim do ano passado. O único país que ainda insiste na "Covid zero" é a China, que lança mão de testes em massa e um sistema hi-tech para que só aqueles com resultados negativos possam circular livremente. No domingo, o país registrou 680 novos casos, menos que os 869 de sábado, enquanto as autoridades agem para conter surtos localizados.

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