Alguma vez você já teve a sensação de acordar de um sono profundo sem conseguir se mexer, falar ou até mesmo reagir? Esse tipo de acontecimento se chama "paralisia do sono" e é comum a uma em cada 20 pessoas. Mas o normal é que a sensação se limite a alguns minutos. E quando ela permanece por dias, semanas ou meses?
Seria como se você estivesse acordado e totalmente consciente do que está acontecendo, mas incapaz de mover qualquer parte do corpo. Como se você estivesse completamente paralisado – mas acordado.
Terry estava assim quando o conheci, pouco tempo depois os primeiros sinais da Síndrome de Guillain-Barré (SGB), doença em que o próprio sistema imunológico ataca as células nervosas do corpo, causando fraqueza muscular e, por vezes, paralisia. Vários países que tiveram surtos de Zika, inclusive o Brasil, têm relatado aumento nos casos da doença.
Entre os sintomas da síndrome está a fraqueza de braços e pernas; em casos mais graves, pode haver dano aos músculos respiratórios. Os sintomas podem durar meses. A agência de doenças e medicamentos dos EUA esclarece que a maioria dos pacientes se recupera totalmente, ainda que a SGB possa causar a morte.
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O caso do galês Terry era extremo: o engenheiro de comunicação de 31 anos sofria dessa doença de uma maneira tão intensa que estava perto de desenvolver uma condição ainda mais grave: a chamada Síndrome do Enclausuramento.
Em outras palavras, por causa da SGB, o sistema imunológico confunde os nervos com a infecção e os ataca – causando danos graves. Como resultado, os pacientes não conseguem mais enviar sinais nervosos da mesma maneira e perdem o controle sobre seu próprio corpo. A doença tem diversos estágios, e a paralisia quase completa de Terry estava em um dos extremos mais raros.
Não há nenhuma cura "mágica" para esse mal. Terapias podem acelerar a recuperação, mas a base de tratamento para casos mais graves é simplesmente dar apoio aos órgãos do paciente e mantê-los vivos até que eles possam se recuperar. Terry passou mais de 100 dias no hospital até que ficasse suficientemente bem.
Comunicação
Uma paralisia muscular tão grave não tira apenas o movimento da pessoa, mas também sua capacidade de se comunicar. Terry tem mais ou menos a minha idade e me chamou a atenção a rapidez com a qual perdeu habilidades básicas de comunicação. É uma situação assustadora.
Estávamos muito preocupados com o dano psicológico que isso poderia causar. Precisávamos combater isso de uma forma rápida e confiável.
Você viu?
Eu queria fazer tudo o que fosse possível para ajudar a aliviar o sofrimento dele. Era uma situação rara que soubéssemos tão pouco da personalidade de um paciente depois de tanto tempo de tratamento – eu tinha muita vontade de conhecê-lo melhor e saber mais sobre ele.
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A SGB deixava Terry apenas com os movimentos dos olhos – esse era nosso único canal de comunicação. A equipe de terapeutas de fala e fonoaudiólogos já estava envolvida nisso e tentava encontrar maneiras de se comunicar com ele – levantando as pálpebras dos olhos e fazendo perguntas, por exemplo.
Se Terry respondia olhando para a direita, queria dizer que sim. Se o fizesse olhando para a esquerda, queria dizer que não. Parece muito simples, mas os músculos dos olhos de Terry se cansavam com facilidade e abrir as pálpebras expunha seus olhos a uma luz cegadora, já que seu estado habitual era a escuridão.
Muitas vezes, ele não respondia simplesmente porque estava dormindo. Então pensei em uma solução tecnológica mais eficiente.
Falando com os olhos
Decidimos investir em algo tecnológico, como o uso de um tablet para a comunicação por contato visual. Esse dispositivo utiliza uma grade com o alfabeto na tela e câmeras de contato visual para acompanhar o olhar de Terry — enquanto ele era capaz de abrir os olhos de maneira espontânea.
Simplesmente olhando a letra ou a palavra que queria e, assim, pressionando o interruptor, ou descansando seu olhar durante tempo suficiente, Terry poderia selecionar ou escrever palavras e frases.
Foi um grande avanço, principalmente para suas terapeutas. Assim, Terry podia, de certa forma, "falar" de novo. Com o tempo, seu sistema imunológico parou de atacar seus nervos e seu corpo começou a recuperar os danos causados.
Uma vez que seus músculos do peito ficaram maiores, nós pudemos tirar o tubo respiratório e isso lhe permitiu falar bem pela primeira vez em meses. Estava claro que Terry havia melhorado sensivelmente sua forma de se expressar, e se sentiu aliviado por conseguir se comunicar.
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O corpo de Terry segue melhorando e ganhando força à medida que ele continua a reabilitação, agora fora do hospital. O tratamento me surpreendeu pelo uso da tecnologia para satisfazer a necessidade fundamental do ser humano – que é se comunicar. O valor e a capacidade de recuperação de Terry foram incríveis. Foi uma verdadeira lição de que o silêncio também tinha uma grande força.
*James Williams é consultor de terapia intensiva e anestesia