BBC News Brasil

Sergio Canavero, o italiano que diz ser possível fazer um transplante de cabeça foi duramente criticado por colegas
Facebook
Sergio Canavero, o italiano que diz ser possível fazer um transplante de cabeça foi duramente criticado por colegas

Um cirurgião italiano que diz ser capaz de realizar um inédito transplante de cabeça afirma que já poderia fazer a operação no ano que vem. Em entrevista ao programa Newsbeat, da BBC, Sergio Canavero afirma ter voluntários para o procedimento, que consiste em usar o corpo de um doador para ter a cabeça afixada a ele. Canavero está confiante de que a medicina tem recursos para fazer da técnica uma realidade.

+ Robô realiza a primeira cirurgia intraocular para restaurar visão

"Não estamos a uma década ou a anos (do transplante de cabeça ). Eu espero ter tudo pronto para começar a trabalhar no final de 2017. Mas é claro que a realização depende da disponibilidade de um doador. O último transplante facial demorou diversos meses para ser feito por falta de um doador adequado. Mas a tecnologia estará disponível".

Apesar do imenso risco envolvendo a cirurgia, o médico italiano diz ter muitas pessoas se oferecendo como cobaias - dispostas a, na prática, trocar seu corpo por um mais saudável.

Ele diz que, por conta da tecnologia disponível, países como Reino Unido, Alemanha e França seriam os mais indicados para realizar o transplante de cabeça.

O paciente

Mas, pelo menos por enquanto, Valery Spiridonov, um russo de 31 anos, é o primeiro da fila: em estado terminal, ele quer que sua cabeça seja transplantada a um corpo que não esteja debilitado como o seu.

Valery sofre da Doença de Werdnig-Hoffman, uma condição degenerativa muscular que o força a usar cadeira de rodas. Em entrevista ao programa de TV britânico Good Morning Britain, o russo disse que quer recuperar sua independência, melhorar suas condições de vida, ajudar a ciência e "ser capaz de cuidar de mim mesmo".

"Minha vida hoje é muito difícil. Dependo muito das pessoas, e se houver uma forma de mudar isso, acredito que ela deveria ser testada e usada", disse.

No entanto, ele disse que sua namorada não quer que ele faça a cirurgia. "Ela me aceita como sou e diz que não preciso mudar".

Em uma entrevista coletiva no início do ano, Valery foi incisivo ao responder perguntas mais críticas sobre a operação e os dilemas éticos envolvidos. "Gostaria de saber se alguém aqui se colocaria meu lugar, precisando de ajuda para tudo e vivendo uma vida sem sexo".

Como fazer?

Canavero diz que o transplante requereria a mão de obra de 150 médicos e enfermeiros, duraria 36 horas e custaria o equivalente a R$ 42 milhões. O primeiro passo seria congelar o corpo do paciente para preservar as células do cérebro.

O passo seguinte seria drenar o cérebro de Valery e substituir o sangue com uma solução cirúrgica.

Você viu?

A partir daí, o pescoço do paciente e do doador seriam cortados para que as artérias e veias importantes fossem envoltas com tubos feitos de uma combinação de silicone e plástico - esses tubos seriam comprimidos para impedir o fluxo de sangue e depois afrouxados para facilitar a circulação quando a cabeça fosse reconectada.

Uma parte ainda mais delicada é o corte da medula espinhal, algo que seria feito com um bisturi especial, feito de diamantes, por causa de sua força. A cabeça, então, é movida para o novo corpo e as medulas, conectadas com um tipo especial de cola.

Os desafios seriam enormes, a começar pelo perigo da rejeição do corpo pela cabeça, das dificuldades em reabilitar o paciente após a cirurgia e, sobretudo, da incerteza sobre como será possível integrar a parte da espinha que começa na cabeça e prossegue pelas costas do corpo humano.

Testando a ciência

Canavero conta que primeiro testará o procedimento em doadores que tenham tido morte cerebral. "Vamos simplesmente cortar a medula espinhal e, durante seis a 12 horas, monitorar a recuperação e a condição neuro-fisiológica", diz o italiano.

Ele deposita suas esperanças também na substância usada para reconectar a medula espinhal - um polímero inorgânico chamado polietilenoglicol.

"Agora temos uma substância que faz o milagre de renovar uma medula espinhal cortada. Os resultados que temos são espetaculares. Fizemos um teste com um cachorro e ele se recuperou em duas semanas. Ele conseguia correr".

+ A invenção de um estudante de 22 anos que pode salvar 1 milhão de vidas por ano

'Ficção científica'

A maioria dos especialistas médicos classifica a proposta de Canavero como "ficção científica" e acha que um transplante de cabeça é impossível - além de potencialmente trazer dilemas éticos e submeter pacientes a procedimentos que podem ser muito dolorosos.

Em reportagem de abril, o jornal britânico The Independent citou Arthur Caplan, fundador do Centro de Bioética da Escola de Medicina da Universidade de Nova York, dizendo que Canavero era um "charlatão" que visava a "autopromoção" oferecendo "falsas esperanças" aos pacientes.

Há quem também duvide de que a aprovação de órgãos regulatórios, o financiamento e a capacidade técnica para o transplante estejam disponíveis no fim de 2017, como prevê Canavero.

Em uma conferência de cirurgia cerebral em Annapolis, EUA, em julho, a palestra de Canavero foi uma das mais esperadas e comentadas. 

Muitos colegas viram o procedimento com ceticismo; outros destacaram, porém, que diversas descobertas científicas já foram classificadas de "loucura" antes de serem concretizadas - além de terem permitido outros avanços científicos em paralelo a sua concretização.

Canavero, por sua vez, diz já ter testes em macacos para usar como base e que o procedimento tem "90% de chances de sucesso". "Isso quer dizer que o paciente acorda sem danos e já começa a andar dentro de um mês ou depois de fisioterapia", explica.

"Estamos dando esperanças às pessoas que têm sido decepcionadas pela medicina ocidental".

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!