A epilepsia é uma manifestação neurológica que causa alterações cerebrais no portador da doença
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A epilepsia é uma manifestação neurológica que causa alterações cerebrais no portador da doença

A epilepsia é uma das doenças neurológicas mais comuns – atrás apenas do Acidente Vascular Cerebral (AVC) e da cefaleia. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS),  50 milhões de pessoas são epiléticas em todo o mundo. 

Apesar de popular, a condição ainda gera dúvidas. Conforme explica o Dr. Lecio Figueira, neurologista do Núcleo de Neurologia do Hospital Samaritano Higienópolis, em São Paulo, a epilepsia é uma manifestação neurológica com alterações cerebrais que geram um “curto-circuito”, responsável por causar as crises epiléticas.

Nesse sentido, o cérebro trabalha com impulsos elétricos, estimulando os neurônios e inibindo-os. “Quando ocorre excesso de estímulos ou falta de inibição, surgem as crises”, explica o profissional. Essas crises são classificadas em diferentes categorias e divergem quanto aos sinais.

Tipos de convulsões

No caso em que todo o cérebro é ativado, a chamada convulsão tônico-clônica, a pessoa perde a consciência, apresenta tremores em todo o corpo, pode urinar, morder a língua e até babar. Se ela estiver de pé, irá cair no chão e, dependendo do local da queda, poderá se machucar.

Segundo o Dr. Lecio Figueira, outros tipos são reconhecidos atualmente e divididos em dois grupos. Um deles é a crise generalizada, que envolve os dois lados do cérebro e apresenta como sintomas  contrações musculares rápidas, perda repentina da consciência e crises de ausência, em que a pessoa fica parada, não fala e apresenta olhar vago.

Já a outra, intitulada de crise focal, somente uma região do cérebro é atingida e pode ficar restrita somente a ele ou se difundir para outras zonas. Os sinais vão variar de acordo com a parte afetada. Se for na área motora do lobo frontal, por exemplo, movimentos anormais podem acontecer. No lobo temporal, por sua vez, os sintomas envolvem taquicardia, sensação de medo e alteração no pensamento.

As convulsões

A psicóloga Juliana Rodrigues teve a sua primeira convulsão aos 10 anos, em 2002. Na época, os pais e familiares não desconfiaram do diagnóstico e só a levaram ao médico um tempo depois. “Antes de ir ao neurologista, minhas avós me levaram à benzedeira e a uma casa espírita. Só depois fui ao médico, fiz os exames e vi que era epilética”, conta.

Juliana sofre com a crise focal na área da linguagem e, por isso, costuma gritar ao longo das crises. Durante todos esses anos, seus ataques epiléticos foram mudando e adquirindo novas características. O sintoma mais recente aconteceu na segunda semana de outubro deste ano. “Alterei a medicação e, após meses sem ter crises, tive uma e acabei caindo da cama. Nunca havia passado por essa reação”, explica.

A psicóloga declara que consegue sentir que a crise está por vir, em uma sensação de vulnerabilidade conhecida como aura. “Quando passo por isso, penso: tomei o remédio? Caso não, vou lá e tomo na mesma hora”. Entretanto, mesmo assim, a convulsão pode acontecer. Em seguida, se tiver ocorrido, ela volta confusa e inconsciente. “Sinto sono e dá vontade de dormir, mesmo que seja por poucos minutos”, diz.

O especialista do Hospital Samaritano explica que, logo após a primeira convulsão, a pessoa deve ser levada – obrigatoriamente – para um serviço de emergência e passar por uma avaliação médica. “Em geral, são solicitados exames de sangue e de imagem, como tomografia ou ressonância de crânio. Eletroencefalograma e coleta do liquor também podem ser importantes. Cabe avaliar cada caso”, informa.

Após ter um ataque epilético, vítima deve procurar um serviço médico e realizar exames
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Após ter um ataque epilético, vítima deve procurar um serviço médico e realizar exames


Com os resultados em mãos, o médico poderá avaliar a necessidade de começar um processo com a inserção de remédios. A cautela é necessária porque até 10% das pessoas, conforme explica o profissional, pode ter uma crise epilética durante toda a vida, sem que, necessariamente, tenha epilepsia. “Caso ocorra uma segunda crise, ou alterações relevantes sejam encontradas na investigação, pode ser indicado o tratamento”, expõe.

Quais as causas

A condição pode se manifestar por diferentes motivos. Entre as razões estão lesão cerebral, sequela de  AVC e infeções, como meningites e encefalites. Em idosos, as causas mais frequentes envolvem as doenças degenerativas cerebrais, como Alzheimer e tumores, somadas às doenças que afetam os vasos cerebrais.

“Doenças imunológicas, como as em que existe produção de anticorpos que alteram o funcionamento dos neurônios, têm sido cada vez mais reconhecidas como causa de epilepsia. Nesses casos, o tratamento pode reverter completamente o quadro”, explica o neurologista. 

Tratamentos possíveis

Assim como Juliana, os portadores devem usar medicações que regulam o funcionamento anormal dos neurônios e controlam a atividade elétrica. Para a prescrição dos remédios, o médico considera importantes aspectos, como idade, tipo de crise e se o paciente possui algum problema de saúde.

Tratamento da doença inclui o uso de medicamentos prescritos após avaliação médica e histórico do paciente
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Tratamento da doença inclui o uso de medicamentos prescritos após avaliação médica e histórico do paciente

Caso o processo medicamentoso não seja suficiente e a doença continue a atacar, uma nova avaliação deverá ser feita para que sejam encontradas outras formas de tratamento, sendo que uma das opções é a cirurgia. Nesse método, o médico localiza a área do cérebro que gera as alterações neurológicas e avalia se é possível remover a lesão sem causar sequelas. Entretanto, o procedimento é arriscado e nem sempre é viável seguir por esse caminho.

Além da intervenção cirúrgica, outra alternativa que pode ser incorporada pelo paciente é o uso de estimuladores cerebrais. Nessa possibilidade, são utilizados aparelhos que estimulam o nervo vago, que possui ação motora e sensitiva, ou o cérebro de forma profunda.

Em crianças, outra opção é seguir a dieta cetônica. Segundo a Associação Brasileira de Epilepsia, essa dieta é pobre em carboidratos e rica em gorduras, fazendo com que haja a produção de corpos cetônicos na urina e também no sangue que, por sua vez, produzem cetose, um estado metabólico que, quanto mais profundo, melhor para tratar as crises.

Há como prevenir?

Além de seguir o tratamento prescrito, algumas medidas simples ajudam a prevenir os ataques, como evitar ficar estressado, dormir bem durante a noite, além de evitar ingerir bebidas alcoólicas. Em um grupo menor de pacientes, estimulações visuais, como luzes piscantes e sons intermitentes podem causar as crises reflexas. Por isso, é bom evitá-los o máximo possível.

É importante ressaltar que, até o momento, não há tratamento disponível que minimize as chances de desenvolver epilepsia após sofrer uma lesão. Em razão disso, o recomendado é tomar cuidado para evitar tais danos. “Usar capacete, cinto de segurança, controlar a pressão arterial, a glicemia e o colesterol, praticar exercício físico regularmente e ter uma alimentação equilibrada são algumas medidas que ajudam a reduzir o risco de lesão cerebral”, exemplifica o neurologista. 

Em gestantes, a recomendação é fazer o pré-natal de forma adequada para ajudar na prevenção. “Contudo, com os conhecimentos atuais, a maioria das crises atribuídas a problemas obstétricos ou ao parto é causada por doenças genéticas”, finaliza o profissional. 

No que devo acreditar?

A doença é popular, mas muitas informações incorretas ainda circulam entre as pessoas. Conforme explica a Dra. Maria Luiza Manreza, neurologista pela Universidade de São Paulo (USP), há quem ainda ache que se trata de uma patologia transmissível. “É comum que especulem a transmissão pela saliva. No entanto, trata-se de uma doença neurológica, que não é transmitida pelo contato”, explica.

Vale mencionar também que a doença não afeta de nenhuma maneira a cognição, ou seja, o portador é capaz de adquirir conhecimento normalmente. “Essa é não é uma doença mental, mas neurológica, que não impede qualquer faculdade mental”, ressalta a Dra. Maria Luiza.

Diagnosticado aos três anos de idade, Eduardo Caminada Junior, Diretor do Purple Day® Brasil, diz que uma das constatações que mais escuta é se é possível engolir a própria língua durante uma convulsão. No entanto, isso não deve ser uma preocupação, uma vez que é biologicamente impossível realizar a ação. O que pode acontecer, de fato, é a saliva em excesso fazer o paciente engasgar, sendo necessário virá-lo de lado e afastar os objetos que estão ao redor.

Mesmo com os desafios a serem enfrentados, Caminada relata que é possível viver normalmente. “Sigo uma vida normal, tenho uma filha saudável, trabalho e sou feliz”. Entretanto, segundo ele, é preciso que as pessoas parem de julgar a epilepsia sem conhecimento. “Existem desafios a serem enfrentados para o tratamento e estabilidade do quadro, mas o  preconceito não deveria estar entre eles”, finaliza.

Como ajudar alguém com epilepsia?

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A princípio, algumas pessoas ficam assustadas ao ver alguém tendo um ataque epilético . Entretanto, saber como a epilepsia funciona e de qual maneira agir nessa situação é fundamental para prestar o socorro adequado e não realizar ações que podem prejudicar a saúde da vítima.

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