Milhares de vidas poderiam ter sido salvas no Reino Unido, não fossem erros do governo na gestão da pandemia de coronavírus, de acordo com Dominic Cummings, ex-assessor do primeiro-ministro Boris Johnson.
O Reino Unido registrou desde o início da pandemia 128 mil mortos por covid, com uma das maiores proporções de mortes por 100 mil habitantes no mundo. Por outro lado, o país foi o primeiro a iniciar a vacinação em massa da população contra covid, e já tem 35% da população totalmente imunizada,com as duas doses da vacina.
Em depoimento a uma comissão parlamentar, Cummings afirmou que Johnson é "incompetente para o cargo" que ocupa, tendo errado por exemplo ao ignorar conselhos de cientistas e adiado lockdowns.
Apesar de o próprio primeiro-ministro quase ter perdido a própria vida para a covid-19 , ele considerou um erro a realização do primeiro grande bloqueio nacional, em 23 de março do ano passado, acrescentou o depoente. Johnson também teria demonstrado resistência a um lockdown no segundo semestre de 2020, por razões econômicas, "ignorando" recomendações de cientistas.
"Dezenas de milhares de pessoas morreram, e não precisavam morrer", disse o ex-assessor, que deixou o governo no final do ano passado após conflitos internos.
"A verdade é que ministros, funcionários de alto escalão e conselheiros como eu sentiram uma falta desastrosa de padrões (de gestão) aos quais o público tem o direito de esperar do governo em uma crise como essa", acrescentou, afirmando que profissionais na linha de frente eram como "leões" sendo "guiados por burros".
"Gostaria de dizer a todas as famílias dos que morreram desnecessariamente o quanto lamento pelos erros cometidos, e por meus próprios equívocos nisso."
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Cummings relatou que escutou do próprio Johnson que este gosta de ser rodeado pelo "caos", uma vez que nessa situação, todos devem se voltar ao primeiro-ministro "para ver quem está no comando".
O assessor confirmou também ter ouvido uma declaração de Johnson, revelada no mês passado pela BBC , de que preferia ver "corpos empilhados" do que implementar um terceiro lockdown.
Já o primeiro-ministro afirmou mais cedo não ter visto o conteúdo do depoimento do seu antigo assessor, mas defendeu que "a gestão dessa pandemia foi uma das coisas mais difíceis que esse país precisou fazer em muito tempo".
"Nenhuma das decisões foram fáceis", disse Johnson em sessão também com parlamentares.
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"Entrar em lockdown é algo traumático para um país, lidar com uma pandemia dessa escala tem sido terrivelmente difícil. Temos tentado em todas as fases minimizar o número de vidas perdidas, salvar vidas, proteger o sistema público de saúde e seguir as melhores evidências científicas possíveis", garantiu o primeiro-ministro.
Plano inicial: imunidade de rebanho
Durante o depoimento de cerca de sete horas, Dominic Cummings abordou a postura de Johnson e de seu governo no início da pandemia.
O primeiro-ministro teria expressado que a covid-19 era só uma "história amedrontadora" e algo como "a nova gripe suína".
Segundo o ex-assessor, o governo apostou inicialmente em uma intervenção limitada, com a esperança de alcançar a pretensa "imunidade do rebanho". O plano foi abandonado conforme ficou evidente o volume de mortes que a abordagem geraria.
O depoente também expressou duras críticas ao ministro da Saúde britânico, Matt Hancock, dizendo que este deveria ter sido demitido por "15 a 20" razões diferentes — algo que Cummings disse ter pedido a Johnson, uma vez que o ministro seria "completamente incapaz de fazer seu trabalho".
Uma das críticas foi pela falha na gestão de Hancock que permitiu que pacientes com alta hospitalar voltassem a ficar em asilos sem serem testados. Cummings também atribuiu ao ministro a falta de equipamentos de proteção individual (EPI) para profissionais de saúde em alguns momentos da pandemia.
O presidente da comissão, o parlamentar Greg Clark, pediu que o ex-assessor de Johnson forneça suas acusações por escrito contra Hancock, que comparecerá à casa legislativa para dar seu próprio depoimento em duas semanas.
Em nota, um porta-voz de Hancock disse rejeitar "totalmente as alegações do sr. Cummings sobre o ministro da Saúde."
"O ministro continuará a trabalhar em estreita colaboração com o primeiro-ministro para garantir a vacinação , o enfrentamento aos riscos apresentados por variantes do coronavírus e o apoio ao sistema público de saúde."
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