Poliomelite pode voltar no Brasil por conta da baixa taxa de vacinação
Agência Brasil
Poliomelite pode voltar no Brasil por conta da baixa taxa de vacinação

A poliomielite está oficialmente eliminada do Brasil e das Américas desde 1994. Entretanto, o pesquisador Fernando Verani, epidemiologista da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), alerta para o risco de reintrodução da doença devido à baixa cobertura vacinal. Apesar da gravidade das sequelas provocadas pela pólio, o Brasil não cumpre, desde 2015, a meta de imunizar 95% do público-alvo, patamar necessário para que a população seja considerada protegida contra a doença.

Segundo o Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), a cobertura vacinal com as três doses iniciais da vacina está muito baixa: 67% em 2021. A cobertura das doses de reforço (a de gotinha) é ainda menor, e apenas 52% das crianças foram imunizadas. Nas regiões Nordeste e Norte, a situação é ainda pior, com percentuais de 42% e 44%, respectivamente, para a imunização completa com as cinco doses.

Em fevereiro de 2022, as autoridades do Malawi, na África, declararam surto da doença após a infecção de uma criança de 3 anos pelo polivírus selvagem tipo 1. Essa cepa está geneticamente relacionada ao vírus circulante no Paquistão, um dos dois países do mundo, junto com o Afeganistão, onde a pólio continua endêmica.

A menina sofreu paralisia flácida aguda, uma das sequelas mais graves da enfermidade, a qual, muitas vezes, não pode ser revertida. O último caso de poliomielite no país africano havia sido notificado em 1992, e a África toda declarada livre da doença em 2020.

“Enquanto a poliomielite existir em qualquer lugar do planeta, há o risco de importação da doença. É um vírus perigoso e de alta transmissibilidade, mais transmissível do que o Sars-CoV-2, por exemplo. Estamos com sinal vermelho no Brasil por conta da baixa cobertura vacinal, e é urgente se fazer algo. Não podemos esperar acontecer a tragédia da reintrodução do vírus para tomar providências”, afirmou Fernando Verani, em comunicado.

A vacinação adequada evita, ainda, o perigo de mutação do vírus atenuado da pólio. No Brasil, essa vacina, popularmente conhecida como "gotinha", é utilizada na rede pública nos reforços contra a doença. A vacina não representa um risco para a criança, já que ela recebeu a vacina inativada anteriormente. Mas há risco de transmissão para não vacinados.

“Quando a população está com baixa cobertura vacinal, há o risco de mutação do vírus, ao ser transmitido de pessoa para pessoa, tornando-se uma cepa agressiva”, disse o virologista Edson Elias, chefe do Laboratório de Enterovírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), em comunicado.

A poliomielite é uma doença infecto-contagiosa aguda causada pelo poliovírus selvagem responsável por diversas epidemias no Brasil e no mundo. Ela pode provocar desde sintomas como os de um resfriado comum a problemas graves no sistema nervoso, como paralisia irreversível, principalmente em crianças com menos de cinco anos de idade.

Sistema de vigilância

Segundo Verani, outro ponto de preocupação para o retorno da doença é a pouca eficiência nas estratégias de vigilância da doença para a contenção de possíveis surtos. O pesquisador explica que há cerca de três anos, os protocolos de vigilância epidemiológica ficaram enfraquecidos no Brasil.

"Eles têm a finalidade de detectar e prevenir as doenças transmissíveis. As amostras de esgoto das cidades não têm sido recolhidas com a frequência esperada, e não há a notificação e investigação constante de possíveis casos de paralisia flácida aguda. O país possui os recursos e a expertise para manter a polio erradicada, mas não está tomando as ações necessárias”, alertou Verani.

No país Malawi, o caso da menina infectada foi rapidamente identificado e a população local foi revacinada contra a poliomielite, impedindo uma epidemia viral. O especialista teme que, caso haja importação da doença, o sistema de saúde não consiga agir com a rapidez necessária para reprimir sua disseminação.

“Se o vírus for reintroduzido e não houver uma notificação rápida do caso, podemos ter uma epidemia. Com as baixas coberturas vacinais que temos hoje, as crianças estão desprotegidas. Podemos ter centenas ou milhares de crianças paralíticas como consequência”, advertiu o pesquisador da ENSP/Fiocruz.

Mundo sem fronteiras


A pesquisadora Dilene Raimundo do Nascimento, da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz, lembra que o mundo não tem fronteiras atualmente. “A pandemia [do coronavírus] veio acentuar ainda mais a vulnerabilidade das populações em relação às doenças infecciosas. Hoje, o deslocamento de pessoas é muito mais fácil e rápido, logo, a possibilidade de circulação do vírus aumenta. Há uma grave possibilidade de a pólio ressurgir no Brasil, como foi com o sarampo, em 2018. Por isso, precisamos chamar a atenção para o risco e para a necessidade de vacinação”.

Em dezembro de 2021, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) e a Secretaria de Vigilância e Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS) assinaram um protocolo de intenções para implementar um programa de Reconquista das Altas Coberturas Vacinais.

O objetivo é implementar ações para reverter a trajetória de queda nas coberturas vacinais dos Calendários Nacionais de Vacinação - da Criança, do Adolescente, do Adulto e ldoso, da Gestante e dos Povos Indígenas e, assim, assegurar o controle de doenças transmissíveis que podem ser controladas com o uso de vacinas, como a poliomielite.

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