
Um projeto conduzido pela professora Sandra Avila, do Instituto de Computação (IC) da Unicamp, está desenvolvendo um modelo de inteligência artificial (IA) capaz de identificar o câncer de pele em pessoas negras. A iniciativa pretende combater o viés racial na dermatologia, onde a maioria das bases de dados e algoritmos ainda se baseia em imagens de peles brancas.
Em parceria com o Living Lab da SAS Brasil, a pesquisa visa criar um banco de dados dermatológico representativo da diversidade brasileira, algo inédito no país. As informações serão coletadas em unidades móveis e centros fixos da SAS Brasil, que atuam em comunidades vulneráveis no Ceará e em Goiás.
Segundo Sandra, a falta de imagens de peles negras compromete o aprendizado dos algoritmos e pode gerar diagnósticos equivocados: “Se o erro humano é ensinado à máquina, o problema se multiplica”, explica. O projeto busca suprir essa lacuna e garantir que a IA reconheça padrões de lesões específicas em tons de pele mais escuros.

Tecnologia e equidade na saúde
O sistema em desenvolvimento utiliza redes neurais para classificar lesões cutâneas como benignas ou malignas, com base em fotos captadas por celulares e dermatoscópios, aparelhos que registram a pele de forma ampliada e detalhada. A expectativa é que, futuramente, o software possa ser utilizado de forma simples e acessível por profissionais de saúde em todo o país.
De acordo com Gabriela Sá, Head de Pesquisa do Living Lab, a integração entre IA e telessaúde pode ampliar o acesso a diagnósticos precoces, especialmente em regiões com escassez de dermatologistas. “A tecnologia pode reduzir o tempo para diagnóstico e tornar o atendimento mais equitativo”, afirma.
A pesquisa, iniciada em 2020, recebeu prêmios do Google e da L’Oréal Brasil, além de apoio da Fapesp e do CNPq. A coleta de dados ocorrerá entre 2025 e 2027, com previsão de resultados até 2028.
Combate ao viés racial na dermatologia
O câncer de pele representa cerca de 30% dos tumores malignos no Brasil, segundo o Inca. Embora mais frequente em pessoas brancas, também afeta pessoas negras, geralmente em regiões menos expostas ao sol, como mãos, pés e unhas. No entanto, a falta de representatividade nos estudos faz com que muitos casos não sejam reconhecidos a tempo.
“Há uma lacuna na formação médica sobre a pele negra, que possui características próprias e exige protocolos específicos”, explica a dermatologista Camila Rosa, colaboradora do projeto.
Mais do que treinar máquinas, Sandra destaca que o projeto educa profissionais e conscientiza a população sobre a importância da observação da própria pele: “Queremos transformar a pesquisa em ação prática, levando o conhecimento científico para quem mais precisa”, conclui.