Entender e aceitar a própria sexualidade ajuda a lidar com doenças crônicas
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Entender e aceitar a própria sexualidade ajuda a lidar com doenças crônicas

Conviver com uma doença crônica, sem cura, como é o caso do diabetes, já é difícil para qualquer pessoa. Agora, tente imaginar toda essa demanda de cuidados que a doença exige na vida de quem precisa lutar diariamente para poder apenas existir ou sobreviver?

 Eu nunca tinha pensado nisso, até que um certo dia, durante a gravação da websérie “Sim, diabético”, eu ouvi de um entrevistado a seguinte frase: “O diabetes não ia me derrubar porque eu já venho numa luta muito mais pesada do que uma doença crônica: a homofobia”. A resposta com a voz embargada foi dada logo depois de eu perguntar o que ele sentiu quando recebeu o diagnóstico de diabetes.

Aquilo me tocou e por alguns dias fiquei refletindo sobre aquela fala. Isso me fez entender algumas atitudes minhas do passado, logo depois do meu diagnóstico.

Eu só tinha 22 anos e, pela primeira vez, tinha me apaixonado por uma pessoa do mesmo sexo. Apesar das piadinhas que costumava escutar na adolescência em relação a minha sexualidade, confesso que, até aquele momento, não entendia quem realmente eu era. O sentimento daquela ocasião confirmava algo que me dava medo.

O processo para eu ter essa resposta e certeza demorou cinco anos. Nesse período, precisei negligenciar parte do meu tratamento do diabetes, não porque eu queria, mas sim pelo fato de que questões prioritárias da vida exigiam minha atenção. Cuidar do diabetes não era prioridade para quem nem existia. Como falar de autocuidado? Eu passava a maior parte do tempo tentado me adaptar aos padrões com medo de que as pessoas não me aceitassem. Como se o fato de ser gay fosse algo errado e inadmissível. Se nem eu mesmo tinha capacidade de me acolher, me entender, como cuidaria de uma doença crônica que exige tanto tempo do dia. Estudos mostram que uma pessoa com diabetes tipo 1, por exemplo, chega a gastar 5 horas do dia tomando decisões relacionadas ao diabetes.  

Tom Bueno com guarda-chuva de arco-íris
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Viva o arco-íris

Como eu disse, foi um processo duro e difícil, mas quando eu mesmo me aceitei, disse: “ok, sou gay e preciso viver essa vida, mesmo que isso não agrade aos outros. Tenho direito de existir como sou e não como minha família ou amigos querem”.  Tenho que admitir que essa aceitação e autoconfiança vieram em um momento em que já tinha saído da casa dos meus pais e já tinha independência financeira. Esse foi meu tempo!

Contei tudo isso para relatar que, depois disso, o autocuidado com o diabetes aconteceu. Entendi que não era só o médico que tinha a missão de tratar. Eu tinha um papel importante e essencial para não ter problemas mais graves decorrentes do diabetes descontrolado. Mas, isso só é possível quando questões básicas são resolvidas. Uma pessoa que não consegue existir ou precisa lutar todos os dias para sobreviver no país que mais se mata pessoas LGBTQIAPN+ o desafio de também ser diabético, por exemplo, acaba sendo ainda mais difícil para a maioria. Nem todo mundo tem a mesma sorte ou privilégio que eu, sem bem disso.

Por isso, eu sempre digo que o preconceito mata e adoece pessoas que só querem existir como são, como devem ser.  Por isso a fala do Daniel na minha entrevista é muito forte e deixa uma reflexão: até quando o fato da pessoa ser quem ela apenas é vai ser mais doloroso do que o diagnóstico de uma doença crônica sem cura?

Essa é uma questão para todos. Amor é amor!

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