Com um número ainda elevado de casos e internações por Covid-19, e diante da resistência de parte da população a se imunizar com as vacinas oferecidas pelo governo russo, um grupo de médicos de 11 hospitais do país fez uma sugestão a celebridades e políticos antivacina: os convidou a visitar as alas destinadas ao tratamento de pessoas infectadas pelo novo coronavírus.
“Estamos um pouco ocupados agora, vocês podem imaginar. No entanto, dada a quantidade de pessoas que leem e ouvem vocês, nós podemos achar algum tempo para guiá-los pelas zonas vermelhas e unidades de terapia intensiva de nossos hospitais”, diz uma carta aberta publicada nesta quarta-feira, segundo a agência Tass.
Segundo os autores, que incluem chefes de hospitais em Moscou, São Petersburgo, Krasnodar, Sochi e nas repúblicas de Khanty-Mansi e Komi, a visita poderá ajudar a mudar a opinião dos negacionistas sobre a importância das vacinas, fazendo que “morram menos pessoas”.
A iniciativa foi elogiada pelo Kremlin, que também pediu que a abordagem sobre o tema seja feita de maneira "moderada".
"Não seria bom transformar tudo isso em uma caça às bruxas. Aqui, é claro, é melhor adotarmos abordagem muito calma, sóbria e equilibrada é necessária", disse o secretário de Imprensa, Dmitry Peskov.
Entre os famosos negacionistas estão o veterano líder do Partido Comunista, Gennady Zyuganov, o vice-presidente da Câmara Baixa do Parlamento, a Duma, Pyotr Toltstoy e a atriz Maria Shukshina — ela, por sinal, respondeu à carta prometendo escrever diretamente ao presidente, Vladimir Putin, exigindo o fim do que chamou de “orgia promovida pela mídia" sobre as vacinas e a necessidade de imunização. Repetindo argumentos comuns entre negacionistas de todo o mundo, disse que não se opõe à vacinação, mas sim ao uso de “imunizantes experimentais”.
A Sputnik V foi aprovada pelas autoridades sanitárias locais e foi autorizada para uso em mais de 70 países, mas ainda não recebeu o aval da Organização Mundial da Saúde.
De acordo com os números oficiais do Ministério da Saúde, apenas 37% dos russos completaram o ciclo vacinal com um dos quatro imunizantes disponíveis à população, todos produzidos localmente — esse é um fator que, para especialistas, pode estar ligado à baixa adesão, uma vez que muitos não confia na eficácias dessas vacinas, em especial da Sputnik V, e de sua versão de dose única, a Sputnik Light. Por enquanto, não há planos de importar vacinas produzidas em outros países.
A carta foi divulgada no momento em que a Rússia ainda enfrenta a mais grave onda de casos e mortes de Covid-19: a média de infecções diárias é de 35 mil, pouco abaixo da registrada no começo do mês, quando ela chegou a quase 40 mil. Já a média de mortes se mantém no patamar mais elevado desde o início da pandemia, com 1.217 nas últimas 24 horas.
Neste contexto, a vice-premier Tatyana Golikova alertou para o agravamento da situação nas próximas semanas, com a iminência das festas de fim de ano.
"Infelizmente eu tenho que lembrar que agora temos quase 35 mil casos por dia, e precisamos reduzir de forma significativa as infecções, atingindo os patamares desejados de imunização, para que superemos uma nova alta de casos da maneira mais segura possível" declarou Golikova, durante reunião com Putin, citada pela Tass. Para o governo, a meta de imunização ideal é de 80% da população adulta.
Em mais uma tentativa de incentivar a vacinação, o presidente Putin revelou ter recebido a dose de reforço de uma das vacinas disponíveis contra o coronavírus, e que participou de um teste clínico sobre uma vacina nasal, produzida pelo Instituto Gamaleya.
"Foi isso, não senti nada. Nada. Hoje, depois destes dois procedimentos, já pratiquei esportes pela manhã", afirmou Putin. A intenção dos fabricantes é, assim que finalizados os testes, exportar o novo formato da vacina. Também nesta quarta-feira, as autoridades sanitárias da Rússia autorizaram a aplicação da Sputnik V em adolescentes de 12 a 17 anos.
Apesar do reforço vacinal, Putin diz que não tornará a imunização obrigatória na Rússia.