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Bares
Getty Images/BBC
Modelos científicos sugerem que apenas 20% das pessoas - os superpropagadores - seriam responsáveis por até 80% das infecções

Após meses de portas fechadas, bares, restaurantes, shoppings, igrejas e salões de beleza começaram a reabrir recentemente em São Paulo , no Rio de Janeiro e em diversas cidades brasileiras.

Fotos e vídeos virais mostrando calçadas tomadas por cariocas de copo na mão no bairro do Leblon geraram debates acalorados nas redes.

Já rotineiras em cidades europeias que já experimentam um processo de reabertura há algumas semanas, precauções como distanciamento de 2 metros, uso de máscaras e lavagem frequente das mãos não parecem estar entre as preocupações de muitos dos que ocupam as ruas neste momento no Brasil.

Classificadas por cientistas como “superpropagadoras” (tradução livre do termo ' superspreader ', em inglês), aglomerações como festas de aniversário, noitadas em bares ou até reuniões de corais podem dar origem a grandes ondas de infecções por covid-19.

Mas como, na prática, estes eventos podem ser o estopim para dezenas de casos?

A BBC pediu a avaliação do médico Abraar Karan, pesquisador em saúde pública da Escola de Medicina de Harvard, sobre três episódios distintos que aconteceram desde a eclosão da pandemia nos EUA .

A seguir, entenda como alguns eventos variam entre baixo e alto risco de exposição à doença e aprenda a passar longe daqueles classificados como "superpropagadores".

Antes, o que é "superpropagação"?

Em eventos classificados como superpropagadores, o número  de casos transmitidos da doença é desproporcionalmente alto em comparação com os padrões de transmissão geral na população, diz Karan.

"Uma pessoa pode infectar 10, 15 ou 20 pessoas", diz o médico.

Karan diz que os primeiros resultados de pesquisas sobre o tema indicam que a disseminação do novo coronavírus é causada principalmente por esses eventos superpropagadores.

"Diferentes modelos analisaram o assunto e até agora sugerem que 20% das pessoas representam 80% da propagação".

Embora os perfis de risco variem amplamente de evento para evento, Karan ressalta que alguns fatores provocam sinais de alerta.

"Se você tem os seguintes itens: ambientes fechados, lotados, ou com pessoas sem equipamentos de proteção individual, como máscaras, haverá alto risco", diz ele.

Encontro de um coral, Mount Vernon, Washington

O que aconteceu?

Em março, no início do surto nos EUA, 61 membros de um coral no Condado de Skagit, no estado de Washington, se reuniram para a prática semanal do coro.

Uma pessoa presente no encontro de duas horas e meia apresentou sintomas semelhantes a um resfriado. Dias depois, após uma investigação do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, 53 casos de covid-19 foram identificados - o equivalente a 87% dos que haviam se reunido para cantar.

Dois membros do coral morreram mais tarde.

Durante o ensaio, realizado em 10 de março, o espaço estava organizado em seis filas de 20 cadeiras, com um espaçamento entre 15 e 25 centímetros, de acordo com o relatório do CDC.

Os membros ocuparam seus lugares habituais de ensaio. Havia espaços livres, já que cerca de 40 membros do coral não estavam presentes naquela noite. Alguns compartilharam comida durante um intervalo de 15 minutos, embora nenhum membro tenha relatado contato físico entre os presentes.

Por que houve propagação?

Nesse caso, o principal fator de propagação está provavelmente no motivo da reunião: cantar.

Quando alguém canta, de modo semelhante ao que acontece quando se fala alto ou grita, a boca e o nariz expelem gotículas respiratórias, diz Karan.

"Quando você realmente está respirando profundamente pelas vias aéreas, está produzindo mais aerossóis, gotas menores, como sprays, que podem pairar no ar", afirma o médico.

No coral do condado de Skagit, o membro que estava originalmente doente possivelmente expeliu essas gotículas durante o ensaio e elas pairaram no ar enquanto os demais cantavam e socializavam por mais de duas horas.

Festa de aniversário, Carollton, Texas

O que aconteceu?

Em 30 de maio, a família Barbosa se reuniu em um grupo de 25 pessoas para uma festa surpresa de aniversário .

A família do norte do Texas disse à imprensa local que o anfitrião não sabia que estava infectado com covid-19.

Até o final de junho, contou Chance O'Shel, oito membros da família e 10 amigos haviam contraído o vírus, incluindo os avós Frank e Carole Barbosa, que estavam próximos de completar 68 anos.

Tanto Frank quanto Carole Barbosa foram hospitalizados mais tarde e, em 1º de julho, Frank Barbosa morreu.

Por que a propagação?

Para Karan, uma festa de aniversário semelhante à da família Barbosa poderia ter todos os ingredientes para um evento de superpropagação.

"Há muito contato dentro de casa durante uma festa de aniversário", ele diz. "Há pessoas, por exemplo, fazendo fila para usar o banheiro, ou espremendo-se em pequenos corredores onde o distanciamento social é impossível."

Quando as pessoas bebem e comem, surgem mais problemas. Primeiro, é improvável que você use uma cobertura facial enquanto come - o que por si só permite uma propagação mais fácil.

Em segundo lugar, se os convidados da festa começarem a beber, o distanciamento social pode acabar sendo obedecido de maneira mais inconsistente - ou completamente ignorado.

"Estamos pedindo às pessoas que mudem seus comportamentos, pedindo às pessoas que façam coisas que não são naturais para elas para ajudar a conter a disseminação", diz Karan. "Se você introduzir coisas como álcool, é mais provável que as pessoas voltem ao seu comportamento normal e se esqueçam destas novas regras".

É importante saber quem foi infectado inicialmente, ele explica. Quando o caso original é alguém central na reunião, alguém íntimo dos convidados - por exemplo, o anfitrião de uma festa, como foi o caso do aniversário de Barbosa - isso aumenta a possibilidade de contato e pode contribuir para infecções extras.

Pub, East Lansing, Michigan

O que aconteceu?

Em 8 de junho, os proprietários do Harper's Restaurante e Pub - um lugar fechado de quase 1000 metros quadrados, com um grande deck externo - abriram suas portas após semanas de fechamento do covid-19.

Os gerentes passaram por treinamento sobre práticas seguras, as mesas foram separadas um metro e oitenta uma das outras e a capacidade foi limitada a cerca de metade da capacidade original, permitindo aproximadamente 225 clientes.

Porém, em 2 de julho, 152 infecções identificadas em 13 municípios do Estado de Michigan foram ligadas ao Harper's.

Desses casos, 128 relataram que estavam presentes no restaurante em meados de junho, e o restante corresponde a contatos próximos daqueles que estiveram por lá.

Por que a propagação?

Ir a um bar ou restaurante fechado pode equivaler a entrar em um território arriscado, explica Karan.

Semelhante ao que ocorre em uma festa de aniversário , a comida pode ser um fator importante.

"Pessoas comendo não usam máscaras, mastigam, conversam e ficam cara a cara, frente a frente", diz o especialista. Isso permite que gotículas circulem entre os convidados.

Se a música estiver em alto volume ou se a lotação do local dificultar a audição, falar alto também trará risco, diz Karan.

Altas temperaturas adicionam mais um fator de complicação, diz ele.

"Há evidências de que os aparelhos de ar-condicionado possam contribuir para a propagação , potencialmente soprando gotículas ao longo do caminho".

Acrescente o uso de banheiros públicos e compartilhamento de áreas de contato, como maçanetas, e você tem um potencial relevante para que o vírus se espalhe.

"Tomar precauções é importante", diz Karan. "Mas, no fim das contas, em algumas situações, não importa quantas precauções você tome, você continuará exposto a um alto risco, e bares são um exemplo disso".

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