Desde o início da pandemia, médicos e especialistas alertam para a queda na taxa de vacinação para outras doenças em todo o mundo, o que pode colocar em risco a saúde de milhares de pessoas, principalmente de crianças . Doenças como a hepatite B, poliomielite, tuberculose, entre outras, são evitadas por meio de vacinas recebidas ainda na infância.
A procura por imunizantes já vinha em declínio nos últimos anos, mas a pandemia fez com que essa busca caísse ainda mais. "Nos últimos 5 anos essa queda na imunização vinha se acentuando de ano a ano. Com a pandemia, em 2020, ela foi muito maior. Os dados baixam de 60% a 70% da cobertura vacinal, sendo a maior parte nas vacinas do primeiro ano de vida ", explica o médico infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBI).
Segundo Kfouri, além do receio de contaminação pela Covid-19, a falta de percepção de risco também leva as pessoas a retardar a vacinação. "As pessoas não se sentem mais ameaçadas por essas doenças que foram eliminadas ou controladas. Se elas não se sentem ameaçadas, atrasam a vacinação. Esse é o maior fator, na minha opinião. Se as pessoas estivessem se sentindo muito ameaçadas ou com medo, elas dariam um jeito e as coberturas [de vacinas] não estariam baixas", acrescenta.
Além do risco pessoal de adiar a vacinação e contrair essas doenças, o infectologista explica que há também o coletivo. "Muitas pessoas adoecendo, a doença voltando a ocorrer com mais frequência na comunidade e o cenário favorável para a reintrodução dessas que já estavam controladas, esses são alguns dos riscos. Tem a questão individual e a de saúde pública também, que essas comorbidades podem voltar e figurar entre as causas principais de mortalidade infantil, hospitalização e todas as consequências delas".
Débora Santos (nome fictício), mãe do Joaquim (nome fictício), seu filho mais novo, preferiu não arriscar. O menino de 2 anos e meio está com algumas vacinas em atraso devido à pandemia de Covid-19. Além do receio de contaminação, a autônoma e dona de casa disse que a demora no cadastro do filho no posto de saúde também fez com que a vacinação fosse adiada.
"Quando o Joaquim nasceu, ele teve uns probleminhas respiratórios, então ficou na UTI. Ele começou a passar no pediatra e fazia fisioterapia no hospital e, quando recebeu alta, me falaram 'olha, aqui com a gente terminou, agora você pode fazer a carteirinha dele e começar a passar com ele no postinho'. Aí nessa correria de tentar fazer a matrícula, eu chegava no posto e não tinha data, outra hora não tinha a documentação necessária para fazer o registro…. Foi passando, passando e em seguida veio a pandemia", conta a mulher.
Débora não encontrou a carteira de vacinação de Joaquim, mas disse que o filho só deixou de tomar os imunizantes depois que a quarentena foi decretada no Estado de São Paulo, em março de 2020. "Não consigo fazer ideia da última vacina, mas ele tomou todas certas, as que ele deixou de tomar foi a partir do início da pandemia, e eu deixei de dar por medo mesmo".
A autônoma mora em Itapecerica da Serra, município localizado na região metropolitana de São Paulo, e disse que conhecidos que trabalham nos postos de saúde da região relataram saber de casos de funcionários que estavam indo trabalhar com sintomas da Covid-19 ou que retornavam à função apenas uma semana após testar positivo para a doença.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em caso de sintomas, a pessoa deve seguir em isolamento social por pelo menos 13 dias, sendo que os últimos três devem ser livres de sinais de contaminação.
"A última vez que eu fui nesse postinho onde ele toma as vacinas, fui levar um pedido médico e conversei com uma conhecida minha de lá, que me disse que estava com muita dor de cabeça. Quando perguntei o motivo ela falou que teve Covid, não sabia se estava tendo de novo, se estava voltando ou se era uma recaída. Então eu perguntei se ela não tinha tirado licença, e ela respondeu que tirou uma de sete dias. Ninguém se cura em sete dias", conta.
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O Portal iG entrou em contato com a Prefeitura de Itapecerica da Serra para esclarecimentos, que informou, por meio de nota, seguir os protocolos de afastamento dos funcionários em caso de resultado positivo para a doença.
"A Autarquia Municipal de Saúde esclarece que todas as unidades de saúde do município disponibilizam testes para Covid-19 aos municípios e também para qualquer funcionário que apresente sintoma da doença. Conforme determina o protocolo, a partir da coleta do teste, o paciente se mantém isolado até o resultado do exame. No caso de resultado positivo, o afastamento é de até 14 dias, a contar da data dos primeiros sintomas e não da data do resultado do exame", escreveu a Prefeitura.
Vacina da gripe
A campanha de vacinação contra a gripe teve início no último dia 12, e o Ministério da Saúde estima que sejam vacinadas 79,7 milhões de pessoas. Em 2021, as crianças de 6 meses a menores de 6 anos, que antes estavam no fim da fila, tiveram a ordem invertida e também foram incluídas no grupo prioritário de imunização contra a influenza .
Essa inversão foi feita para que a vacinação da gripe não coincida com a da Covid-19, mas também para evitar a contaminação pelo vírus da influenza de maneira geral, explica Kfouri. "Entre as crianças, 20% a 30% são acometidas pelo vírus da influenza todo ano. Diferente da Covid-19, a criança é a entrada do vírus da gripe na família, é ela que mais transmite, mais se hospitaliza, tem mais entrada em consultas para doenças em prontos-socorros, usa antibióticos, tem complicação, infecção de ouvido… Então, a carga da gripe na criança é enorme".
O ministério alerta que a vacinação contra a influenza é importante para prevenir o surgimento de complicações decorrentes da doença, óbitos, internações e a sobrecarga nos serviços de saúde, além de reduzir os sintomas que podem ser confundidos com os da Covid-19.
Quem pode ser imunizado nessa campanha?
- Crianças de 6 meses a menores de 6 anos
- Gestantes e puérperas
- Povos indígenas
- Trabalhadores da saúde
- Idosos com 60 anos ou mais
- Professores das escolas públicas e privadas
- Indivíduos com deficiência permanente
- Profissionais das forças de segurança e salvamento (bombeiros, policiais…)
- Forças armadas
- Caminhoneiros
- Trabalhadores de transporte coletivo rodoviário
- Trabalhadores portuários
- Funcionários do sistema prisional
- Jovens de 12 a 21 anos sob medidas socioeducativas
- População privada de liberdade
- Pessoas com doenças crônicas não transmissíveis e outras condições clínicas especiais
A vacinação está sendo feita de forma escalonada, dividindo os grupos prioritários em três etapas. Cidades e estados podem fazer ajustes nas datas dependendo da situação de cada região. Além disso, também haverá um chamado "Dia D", um sábado em que unidades de saúde e outros locais, como parques e shoppings, aplicarão a vacina para aumentar a escala de imunização. Os municípios terão autonomia para definir os dias dessa mobilização.
*Sob supervisão de Ludmila Pizarro