Covid: RJ tem maior alta de óbitos desde fevereiro em idosos de 60 anos ou mais
SILVIO AVILA
Covid: RJ tem maior alta de óbitos desde fevereiro em idosos de 60 anos ou mais

A Fiocruz identificou uma alta na quantidade de óbitos por Covid-19 em pessoas de 60 anos ou mais no Rio de Janeiro. É o primeiro aumento no número de mortes nessa faixa etária desde fevereiro. O dado foi calculado com o auxílio de um método estatístico chamado 'nowcasting', que considera o comportamento dos números da pandemia para compensar o atraso nas notificações e estimar indicadores em tempo real.

Para os cientistas de Métodos Analíticos em Vigilância Epidemiológica (Mave-Fiocruz), que desenvolvem o estudo, a situação dos idosos com 80 anos ou mais é particularmente impressionante. A quantidade estimada de óbitos da última semana epidemiológica para a faixa etária é de 175; em números consolidados, não se vê um número tão alto desde abril.

Na semana passada, como o GLOBO mostrou, os especialistas da Fiocruz detectaram o primeiro aumento no número de hospitalizações por quadros graves de Covid-19 entre idosos em cinco meses. Uma semana depois, ele se refletiu nas estimativas de mortes.

Ao mesmo tempo, o grupo dos 80 anos ou mais manteve, pela segunda semana consecutiva, o crescimento mais acentuado no índice de internações. Ele somou, na última atualização do estudo, 848 hospitalizações estimadas em uma semana. O maior número desde o início da pandemia.

Segundo o pesquisador Leonardo Bastos, responsável pela análise, três fatores podem explicar o repique da Covid-19 entre os idosos: o relaxamento das medidas restritivas, a gradativa perda da proteção conferida pelas vacinas e a variante Delta, mais transmissível que as demais linhagens do coronavírus.

"Como aumentaram as hospitalizações segundo a data de primeiros sintomas, era questão de tempo até que os óbitos aumentassem, infelizmente. A esperança é que as mortes não subam da mesma forma que as internações, pois a efetividade das vacinas para evitar óbitos é maior que para evitar hospitalizações", diz Bastos.

Integrante do Mave e desenvolvedor das análises do Boletim InfoGripe, o pesquisador Marcelo Gomes acredita que o efeito das vacinas pode já ter chegado a um ponto de saturação, especialmente nos mais idosos. Isso preocupa, uma vez que o Rio, como o resto do Brasil, falhou em reduzir o nível de transmissão do vírus.

"A terceira dose em idosos é algo que se discute no mundo todo. Mesmo com a vacina funcionando, reduzindo casos graves e óbitos, ainda assim a população mais idosa continua se mostrando mais vulnerável. Nesse grupo, sabemos que a eficácia das vacinas é um pouco menor do que no resto da população, e também há a questão da perda de memória imunológica, que é natural nos mais velhos. Isso realmente precisa ser discutido. Mas a gente não pode perder de vista que existem outras medidas. Não podemos deixar só na mão das vacinas o nosso cenário epidemiológico", afirma Gomes.

Nesta sexta-feira, na divulgação do 32° boletim epidemiológico do Rio, Paes disse ter solicitado à Secretaria municipal de Saúde um novo calendário para a próxima etapa da vacinação na cidade, que deve ser divulgado na semana que vem. A intenção da prefeitura é vacinar adolescentes e, simultaneamente, aplicar a injeção de reforço em idosos.

"Pedi ao Soranz que apresente, entre hoje e segunda-feira, um calendário que contemple a vacinação de adolescentes, que vamos vacinar com mais calma, com mais tempo, porque esse público geralmente não contrai casos graves. E, no Rio de Janeiro, vamos pressionar pela terceira dose para idosos. Por favor, vamos mandar a dose da vacina. Nesse momento, (a) situação (é) de guerra", disse Paes. "A gente vai pressionar aqui no Rio pela dose de reforço. Os idosos precisam de dose de reforço. Tem muita imunização que de certa maneira já se foi. E você tem uma variante Delta dessas, a pessoa pega e o risco de ter caso grave é maior. Minha ansiedade para acabar os 18 anos é porque a gente precisa, sim, vacinar pessoas mais velhas".

Crianças e adolescentes

Embora o novo agravamento da pandemia ameace sobretudo os idosos, as estimativas da Fiocruz mostram que os menores de idade, alvo da próxima fase da campanha de vacinação na cidade, atravessam agora o pior momento desde o início da pandemia no Rio de Janeiro. Na última atualização das projeções de nowcasting, a tendência de alta nas internações por síndrome respiratória aguda grave em crianças e adolescentes com diagnóstico de Covid-19 se acentuou pela segunda semana consecutiva nas faixas etárias de 0 a 9 anos e 10 a 19.

Para Leonardo Bastos, o cenário inédito retratado pelos números é uma consequência inevitável do aumento do nível de exposição ao coronavírus entre os menores.

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"O nível de exposição das crianças aumentou tanto que uma parte das crianças que se infectaram evoluiu para um quadro mais grave", avalia. "Não acredito que a volta às aulas presenciais tenha tido influência sobre esse número por enquanto, mas ela deve ter um impacto futuro. As escolas, com protocolos desatualizados, podem aumentar o nível de exposição das crianças e posteriormente um aumento de hospitalizações".

Embora representem uma pequena porção dos internados por SRAG no estado, crianças e adolescentes já vinham apresentando uma clara tendência de crescimento no índice desde a semana epidemiológica 30, que foi de 25 a 31 de julho. O dado se confirmou novamente na semanas epidemiológicas 31 e 32, a mais recente.

Em se tratando de casos notificados, a série histórica para as faixas etárias vai ao encontro das previsões do instituto. Dados extraídos pela própria Fiocruz do sistema Sivep-Gripe, do Ministério da Saúde, mostram que a faixa dos 0 a 19 anos chegou a representar mais de 10% das internações por SRAG no estado, a maior proporção desde o fim de fevereiro. O número pode ter sido influenciado pelos efeitos da vacinação, que reduziram a quantidade de hospitalizações entre os mais velhos, ampliando o percentual dos mais novos.

Para Bastos, uma outra hipótese para o aumento de notificações de SRAG entre crianças e adolescentes com diagnóstico de Covid-19 é a chamada contaminação cruzada. Ela acontece quando uma pessoa dá entrada no hospital com sintomas decorrentes da infecção por um patógeno, mas ao mesmo tempo porta outro, que não dá indícios de presença.

No caso dos menores de idade, este segundo patógeno seria o coronavírus, que tende a desenvolver quadros assintomáticos de infecção em crianças. Assim, um menor de idade pode ser hospitalizado por outro tipo de virose respiratória — por exemplo, um vírus sincicial respiratório (VSR), que acomete com mais frequência crianças de 0 a 9 anos e tem um forte componente sazonal — e entrar também para os registros de diagnósticos de Covid-19, por portar o coronavírus no momento da internação.

"Os relatos são de que crianças têm um quadro muito leve de Covid, até mesmo infecções assintomáticas. Então a criança ter se infectado por Covid e outra coisa não é algo impossível", lembra o especialista.

Aumento nos índices

O aumento no número de atendimentos de casos de síndrome gripal e síndrome respiratória aguda grave na rede municipal preocupa a prefeitura. Embora o índice esteja num patamar inferior aos recordes registrados no ano passado, ele já se aproxima da marca que alcançou no último pico de casos no município, que se encerrou em maio. Naquele mês, a média móvel de atendimentos diários chegou a 454; na segunda-feira, foi a 427. Salta aos olhos também seu aumento rápido: entre os dias 2 e 9 de agosto, o indicador cresceu 14%.

Os novos números surgem na esteira de uma tendência deflagrada pelo aumento na quantidade de casos confirmados de Covid-19 na cidade, anunciado na semana passada. Embalado pela variante Delta, mais transmissível, ele interrompeu uma festejada sequência de cerca de dez semanas de queda nas notificações. Agora, a perspectiva de agravamento é que se consolida: como mostram as contagens atualizadas, o Rio registrou na semana epidemiológica 29, que foi de 18 a 24 de julho, o maior número de casos de síndrome gripal desde a semana epidemiológica 21, que foi de 23 a 29 de maio, quando o estado ainda se recuperava de uma terceira onda. Foram 35.299 casos na semana mais recente, contra 36.205 em maio.

O número de internados em UTIs de Covid-19 no município também segue uma curva de aumento, tendo chegado, nesta terça-feira, ao maior patamar (465) desde 2 de julho (574), quando a última onda da pandemia na cidade se abrandava. A taxa de ocupação para leitos reservados ao tratamento da Covid-19 está em 94%, segundo dados extraídos do Censo Hospitalar da Secretaria municipal de Saúde na tarde desta sexta-feira. No estado inteiro, a fila por um leito de Covid-19, que também vem crescendo, chegou à maior marca desde o dia 10 de maio. Foram 152 nesta quinta-feira, contra 157 naquela data.

Diante do novo cenário, o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, informou, na divulgação do 32° boletim epidemiológico, que o Rio de Janeiro reabriu 60 leitos de Covid-19 na última semana.

"A gente tá avançando na vacina, mas temos um aumento preocupante de casos no Rio. Estamos no meio do inverno, com uma nova variante circulando. É muito importante que as pessoas respeitam as medidas restritivas, além de usar máscara. Ainda vemos muita gente desrespeitando a norma de uso de máscara", disse Soranz.

Pela segunda semana consecutiva, por influência da variante Delta, todas as 33 Regiões Administrativas da cidade do Rio estão com nível alto de risco de contaminação por Covid-19. As medidas restritivas em vigor atualmente, contudo, foram prorrogadas.

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