Covid-19: por que os mais jovens estão com baixa adesão à 3ª dose?
Rovena Rosa/Agência Brasil - 19.01.2022
Covid-19: por que os mais jovens estão com baixa adesão à 3ª dose?

Em meio à recente ampliação do perfil dos grupos que poderão receber a quarta dose das vacinas para a Covid-19, uma realidade dramática se apresenta: a baixa adesão ainda ao terceiro reforço dos imunizantes. E, surpreendentemente, as taxas mais baixas estão entre os mais jovens.  É o que mostra um levantamento do Lagom Data, que reúne dados do Ministério da Saúde.

O índice nacional é de 33,5%, segundo dados do World in Data. Para se ter uma ideia, o Chile e a Itália têm, respectivamente, 77,4% e 63,5% de cobertura na terceira dose. O pior cenário do Brasil está entre homens e mulheres de 35 a 39 anos — apenas 37,24% e 29,78%, respectivamente estão com o ciclo das três doses completo. Vale lembrar que todas as pessoas acima de 35 anos — independentemente de comorbidade ou profissão exercida — já têm direito ao reforço, considerando as diferenças de calendário de vacinação das capitais brasileiras e os intervalos entre as doses dos imunizantes disponíveis para aplicação no país. Nas faixas etárias inferiores, os números são mais baixos. No entanto, há regiões do país nos quais as pessoas com menos de 35 anos ainda não estão aptas a receberem a terceira dose.

O gráfico desta reportagem mostra ainda um crescimento nos índices de vacinação de reforço até a faixa etária de 70 a 74 anos — a mais protegida da  população, com 72,42% das mulheres e 71,54% dos homens com a terceira dose no braço. A partir desse grupo, o índice volta a cair, apontando que apenas 50,44% das mulheres e 48,52% dos homens com 90 anos ou mais estão com o esquema vacinal completo contra a Covid-19. 

Especialistas ouvidos por O GLOBO apontam alguns dos motivos que podem ter dificultado a população brasileira de retornar aos postos de saúde para receber a dose de reforço. Entre os mais jovens, a volta ao trabalho presencial e a recente onda de infecções pode ter atrapalhado a aplicação da terceira dose. Recomenda-se esperar um mês após o diagnóstico de Covid para receber o imunizante. Este tempo de espera pode ter contribuído para o esquecimento do reforço. 

Entre os mais idosos — que estão aptos a tomar a terceira dose desde o ano passado — o motivo do afastamento dos postos é o esquecimento (quando receberam a segunda dose ainda não se falava na terceira) e a dependência de serem levados à unidade de saúde por alguém da família (que provavelmente voltou a trabalhar presencialmente). 

Mas, um fator citado pelos especialistas que influencia no atrasado para o reforço de todas as faixas etárias é a falta de uma campanha nacional de conscientização da importância da dose de reforço que deveria ser realizada pelo Ministério da Saúde. 

"Muitas pessoas nem sabem que precisam fazer a terceira dose. Desde que começamos a fazer a vacinação contra a Covid-19, tivemos muitas mudanças de intervalos dos imunizantes e pouca comunicação oficial para orientar as pessoas sobre as novas diretrizes. Se a população não acompanha as orientações pela mídia, fica perdida, pois infelizmente o governo federal não faz uma campanha para estimular a vacinação", afirma Juarez Cunha, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). 

O médico relembra que esquemas vacinais que demandam mais de uma dose — como é o caso contra a Covid — costumam apresentar índices decrescentes da segunda aplicação em diante. No entanto, as taxas brasileiras poderiam ser melhores se o Ministério da Saúde assumisse seu papel de reforçar a importância da vacina e de combater as fake news que colocam a segurança e eficácia dos imunizantes em dúvida.  

"A desinformação entorno da dose de reforço contribuiu muito para desestimular a vacinação. Passaram a propagar que "se precisa tomar mais uma dose, é porque a vacina não adianta". Conforme o tempo foi passando, as mentiras foram se espalhando, e não vimos nenhuma campanha maciça informando sobre a importância da terceira dose", critica a epidemiologista Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

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Na avaliação da especialista, é bastante problemático que grande parte da população economicamente ativa não tenha tomado a dose de reforço ainda. Essas pessoas têm uma grande mobilidade pela cidade, consequentemente se tornando uma grande fonte de propagação da doença.  

"A baixa adesão desse grupo é preocupante. Já sabemos que quem toma a dose de reforço e mesmo assim se contamina, apresenta uma quantidade menor de vírus. Com isso, aqueles que já tomaram a terceira dose transmitem menos a doença do que as pessoas não vacinadas ou só com duas doses. Portanto, é preciso estimular as doses de reforço", pontua Maciel.  

Por outro lado, a cobertura da dose de reforço entre os idosos também preocupa. Apesar de ser o grupo com as maiores porcentagens da terceira dose — apenas a faixa etária acima de 90 anos e os homens de 60 a 64 anos estão com taxa de reforço abaixo de 60% — o grupo é um dos mais vulneráveis a ter desfechos negativos após uma contaminação pelo coronavírus.  

"Todos poderiam já ter feito o reforço vacinal, que já está liberado para eles desde o ano passado, mas infelizmente ainda não fizeram. Esperávamos taxas mais altas. Isso é preocupante, pois são um dos grupos mais vulneráveis para a Covid-19. É preciso imunizar urgentemente esta faixa etária", alerta Cunha. 

A importância da terceira dose 

Completar o ciclo de três doses da imunização contra a Covid-19 é essencial. Ele protege contra a Ômicron, a cepa dominante no mundo atualmente, em um nível de proteção semelhante ao que duas doses proporcionam contra as variantes Alfa e Delta. É o que concluiu o estudo feito por um grupo de pesquisadores de 21 hospitais americanos, publicado na revista científica The BJM. 

Na pesquisa, os cientistas analisaram a eficácia das vacinas Pfizer e Moderna, utilizadas nos EUA para proteger contra o coronavírus. Eles observaram que a efetividade de duas doses de um imunizante de mRNA para prevenir a internação hospitalar por Covid-19 foi menor para a variante Ômicron (65%) do que para as cepas Alfa e Delta (ambas com 85%). No entanto, a aplicação da terceira dose elevou a 86% a eficácia da vacina contra a Ômicron. 

Na publicação, os cientistas comprovaram também que — mesmo em menor escala quando comparada com outras cepas — a Ômicron pode sim provocar infecções graves e causar óbitos. Cerca de 15% dos pacientes internados com a variante precisaram de ventilação mecânica invasiva, sendo que 7% morreram em uma das unidades de saúde participantes do estudo. 

O Brasil começou a aplicar a terceira dose da vacina contra a Covid-19 em setembro de 2021. Na época, o reforço era destinado a idosos, a imunossuprimidos e a profissionais de saúde. Em novembro, a dose adicional foi ampliada para toda a população brasileira acima de 18 anos, inicialmente no intervalo de cinco meses depois da segunda dose. Logo depois, o espaçamento foi reduzido para quatro meses. 

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