Um dos maiores desafios no tratamento de pessoas com autismo é o complexo diagnóstico, que envolve uma série de avaliações a longo prazo de aspectos do dia a dia da criança por especialistas. Essa dificuldade deve-se ao fato de não haver exames simples capazes de emitir um laudo definitivo do quadro, já que as causas da patologia ainda são incertas.
No entanto, a ciência avança para compreender ao menos quais são as alterações, a nível biológico, no organismo da pessoa autista, um conhecimento que poderá não apenas tornar a detecção do problema mais fácil, como auxiliar no desenvolvimento de novas e mais eficazes terapias.
Um estudo publicado nesta sexta-feira na revista científica Science mostra que a ciência está cada vez mais perto de encontrar essa resposta. Pesquisadores do departamento de Psicologia e Neurociência da Boston College, nos Estados Unidos, utilizaram inteligência artificial (IA) para analisar imagens cerebrais, obtidas por meio de ressonância magnética, de 1.103 indivíduos com autismo. A partir dos resultados, eles conseguiram identificar, de forma inédita, mudanças na anatomia do cérebro dessas pessoas.
"Descobrimos que diferentes pessoas com o transtorno do espectro do autismo (TEA) podem ter diferentes áreas cerebrais afetadas e, graças aos cérebros simulados por IA, conseguimos identificar quais regiões específicas do cérebro variam entre os indivíduos com TEA", explicou o pesquisador de pós-doutorado da Boston College e autor principal do estudo, Aidas Aglinskas, em comunicado.
Os pesquisadores explicam que a variabilidade nas áreas afetadas acontece porque o autismo é diferente, tanto nos sintomas, como na neuroanatomia, em cada indivíduo. Isso fazia, inclusive, com que o diagnóstico tivesse diferentes classificações no passado. Com o tempo, todas as condições caracterizadas pelo comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem, com graus de funcionalidade distintos, foram englobadas no transtorno do espectro autista (TEA).
Além disso, as anatomias dos cérebros têm divergências devido a uma série de fatores que não estão ligados à patologia, e separá-los dos demais foi um desafio, afirmam os cientistas. Foi justamente para superar esse entrave que a equipe decidiu utilizar a inteligência artificial, identificando padrões de variabilidade da neuroanatomia que fossem específicos do TEA. Os pesquisadores afirmam que isso tornou possível detectar também alterações específicas ligadas aos diferentes sintomas entre pessoas com autismo.
A inteligência artificial foi capaz ainda de criar uma simulação de como os cérebros dos participantes seriam sem as alterações anatômicas. Agora, o objetivo dos cientistas é utilizar a tecnologia para observar além da estrutura do cérebro, em busca de outras formas que possibilitem compreender melhor o diagnóstico e o comportamento dos pacientes.
"Há uma série de outros aspectos do cérebro que precisaremos analisar para obter uma imagem completa. No momento, estamos focados na conectividade funcional - um indicador de como o cérebro está 'conectado'. Uma grande questão é se isso nos mostrará algo novo sobre as diferenças individuais dentro do TEA. O objetivo desse tipo de trabalho é poder usar dados de imagens cerebrais para ajudar no desenvolvimento de abordagens personalizadas de saúde para pessoas com TEA.”, explicou o também pesquisador da Boston College e co-autor do estudo, Stefano Anzellotti, em comunicado.
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