Duas das mais importantes instituições médicas na área no país, a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso) e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), lançaram em conjunto uma proposta de nova classificação para a obesidade.
A sugestão é focar mais na saúde do que na estética. Dessa forma, propõem focar menos no método tradicional com números para definir a condição, ou seja, a fórmula que usa o peso e a altura para predizer se a pessoa está ou não acima do peso, o famoso IMC (Índice de Massa Corpórea).
No lugar, a quantidade de peso que a pessoa perdeu, considerando o peso máximo que atingiu na vida. Assim, uma redução de 5% a 10% seria classificada como “obesidade reduzida”, enquanto a eliminação de 10% a 15% receberia o nome de “obesidade controlada”.
Parece pouco, mas não é. Os especialistas afirmam que reduções de apenas 5% de peso já proporcionam uma mudança significativa de indicadores de saúde. Uma pessoa com peso inicial de 100 kg e que chega a 95 kg, já começa a experimentar melhora em marcadores metabólicos, como a aumento do colesterol HDL (o "bom"), menor risco de depressão, diminuição das dores nas articulações e melhora da fertilidade.
A perda de peso de 7% tem sido associada a um menor risco de diabetes tipo 2. Dados de um estudo do Programa de Prevenção do Diabetes (DPP) dos Estados Unidos mostram que cada quilo perdido estava associado a uma redução de quase 16% no risco da doença.
Perdas de peso acima de 10% têm efeitos importantes na diminuição da gordura do fígado e no risco de doenças cardiovasculares. Uma perda de peso de 11% foi associada a uma queda de quase 23% no tecido adiposo intra-abdominal, apontando que perda de peso tem um efeito positivo no acúmulo de gordura ectópica, que está associada a aterosclerose. O estudo DIRECT, feito por universidades do Reino Unido, apontou que uma perda de peso de 10% a 15% provocou a remissão do diabetes tipo 2 em 57% e 86%, respectivamente.
Na questão estética, por sua vez, a redução de 5% a 15% talvez não tenha um efeito visual tão impactante, mas especialistas afirmam que esse emagrecimento já gera reduções de medidas, principalmente na circunferência abdominal.
O IMC
Atualmente, a obesidade é classificada no mundo inteiro com base no IMC. Esse índice é calculado dividindo o peso corporal pelo quadrado da altura (peso / altura x altura). A partir desse resultado, classifica-se o paciente. Pessoas com IMC de 18,5 a menos que 25 são consideradas "saudáveis"; já aqueles com o índice entre 25 e 30 são classificados com "sobrepeso"; de 30 a 35 é obesidade grau I; de 35 a 40, obesidade grau II (severa) e acima de 40, obesidade grau III (mórbida).
A nova classificação seria indicada para pacientes com obesidade até o grau I no IMC. Para aqueles com classificação severa ou mórbida, a indicação é a cirurgia bariátrica.
"O cálculo de IMC não leva em consideração a idade, o biotipo e a genética familiar. Às vezes, a pessoa vem de uma família toda magrinha, e aí, é mais fácil manter o IMC, independente dos hábitos de vida e da rotina. Uma pessoa que vem de uma família de estrutura grande, mais encorpada, muitas vezes não consegue chegar ao IMC ideal mesmo que faça dieta e atividade física", comenta Claudia Cozer Kalil, endocrinologista do Hospital Sírio Libanês e membro do departamento de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Abeso.
Por exemplo, uma pessoa de 100 kg e 1,70m de altura tem o IMC de 34,6, ou seja, dentro do parâmetro classificado como obesidade grau I. Para estar no peso considerado saudável, essa pessoa precisaria perder cerca de 30kg. Uma eliminação de tantos quilos pode ser um fator desmotivante para o paciente. A nova classificação tem a proposta de perda de peso gradual, focando mais na melhoria da saúde e na manutenção do peso perdido, do que na redução drástica na balança. A ideia é evitar, principalmente, o efeito sanfona — de "recuperar" o peso perdido.
"Um paciente de 100 kg pode emagrecer e chegar aos 90 kg e não conseguir reduzir mais do que isso. Olhando da perspectiva do IMC, ele está muito longe da meta. Isso pode fazer com que ele se sinta frustrado e desista do tratamento. No entanto, essa redução já teria trazido muitos benefícios para a saúde dele", afirma Marcio Mancini, um dos autores do estudo que propôs a nova classificação e endocrinologista da SBEM-SP.
Segundo Mancini, a ideia é tratar a obesidade como uma doença controlável, assim como outras já bem conhecidas pela população. E, pela nova proposta, a pessoa se sente mais estimulada a seguir com os cuidados para emagrecer.
Sem dietas radicais
A proposta de classificação sugerida pela Abeso e SBEM tem como pretensão oferecer uma ferramenta complementar para avaliação e tratamento clínico dos pacientes. Classificar pessoas com obesidade pela porcentagem de peso perdido valoriza um emagrecimento sustentável (aquele se consegue manter), afirmam os especialistas.
Olhar o tratamento da obesidade sob a ótica da nova proposta de classificação ajudaria os pacientes a não buscarem, por exemplo, por dietas extremas — que às vezes proporcionam, sim, uma redução drástica de peso, mas que não se perpetua, já que é difícil mantê-las pelo resto da vida.
Além da grande possibilidade do efeito sanfona, essas propostas radicais de emagrecimento muitas vezes têm um alto preço para a saúde, o que vai no sentido contrário dos benefícios de se perder peso. O uso de chás "emagrecedores", por exemplo, pode trazer problemas hepáticos e até causar morte, como ocorreu com a enfermeira Edmara Abreu no início deste ano, em São Paulo.
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