O crescente número de casos de Covid-19 no Rio de Janeiro não vem sozinho. Com ele, ocorre também o aumento de pessoas com suspeita ou confirmação da doença que aguardam um leito no estado.
Desde 19 de novembro, essa fila cresceu 254%. Hoje, são 472 pacientes à espera de uma vaga de enfermaria (220) ou de UTI (252), segundo números da Secretaria estadual de Saúde. Há três semanas, eram 133. Nas UPAs, segundo profissionais da área e pacientes, a busca por atendimento com sintomas da doença é cada vez maior.
— Está bem cheio lá dentro. Eu trouxe o meu pai, que acordou com muita falta de ar, cansaço e dor no corpo. Foi atendido, colocado em isolamento e aguarda para fazer os exames. Assim como ele, há vários outros casos suspeitos lá dentro. Tem gente esperando há dois ou três dias e não conseguiu vaga ainda — diz a dona de casa Verônica Assis, de 42 anos, que buscou a UPA de Realengo, na Zona Oeste.
O diretor de comunicação do Sindicato de Médicos do Rio (SinMed Rio), Carlos Vasconcelos, afirma que a superlotação das UPAs no Rio de Janeiro é o primeiro sinal de aumento no número de pacientes com suspeita ou confirmação de Covid-19.
— Essas unidades de saúde são a principal porta de entrada, nelas se concentram os atendimentos primários. E com uma taxa de ocupação de leitos mais alta como a que estamos vivendo hoje, acaba retendo a fila porque geralmente são vagas sem muita rotatividade — explica Vasconcelos.
De acordo com a Secretaria estadual de Saúde, a taxa de ocupação hoje está em 63% em leitos de enfermaria e 82% em camas de UTI. Dos que aguardam na fila, 252 são casos graves e necessitam de terapia intensiva. Já no município, em toda a rede SUS (que inclui leitos de unidades municipais, estaduais e federais), a taxa de ocupação para Covid-19 é de 92% nos leitos de UTI e de 88% nos de enfermaria.
Os números estão distantes do cenário vivido no ápice da pandemia, quando, em 9 de maio, 1.283 pacientes aguardavam por uma vaga de leito, sendo 510 para UTI. Mas, apesar dos números mais baixos, o diretor do sindicato mostra-se preocupado e faz um alerta sobre o interior do estado.
— Essa situação tende a piorar ainda mais depois das festas de fim de ano, onde há uma tendência a festas e aglomerações. Não sabemos onde vamos parar. Além disso, sem os hospitais de campanha, o número de leitos é mais limitado. Em abril e maio, por exemplo, nós tínhamos muitos casos concentrados na capital. Hoje, é o Rio todo. O interior vê a curva crescer cada dia mais. A transferência de pacientes para a região não é mais tão viável, porque lá a situação é tão preocupante quanto.
UPA de Campo Grande sem vagas
A aposentada Lia Pereira, de 90 anos, está há quase uma semana na busca por um leito para internação. No fim de novembro, a idosa começou a apresentar sintomas de Covid-19. Com febre alta, dor no corpo e falta de ar, ela e a filha, a recepcionista Léa Paiva, de 60 anos, foram até a UPA de Campo Grande, Zona Oeste do Rio, para buscar atendimento. Mas a tentativa foi em vão. Sem leitos disponíveis na unidade de saúde, as duas voltaram para casa.
— Disseram que aqui não tinha leito, não vou ficar numa cadeira com a minha mãe aos 90 anos de idade. Já fui no Hospital Rocha Faria e recebi a mesma resposta. Estamos entregues à sorte e à vontade de Deus. Eles querem o quê, que eu volte quando minha mãe estiver morrendo? É puro descaso público — desabafa Léa.
Em pouco mais de uma hora que a nossa equipe esteve na porta da unidade, seis pacientes chegaram com suspeita de Covid-19 e aguardaram pelo atendimento.
— Está bem cheio lá dentro, não tem mais vagas. Hoje estamos com uma média de 400 atendimentos por dia, sendo a grande maioria de casos suspeitos de Covid-19 e com síndrome respiratória. Agora, este é o momento de toda a população mais se conscientizar e seguir as recomendações das autoridades. Com os hospitais cheios, os cuidados pessoais são cada vez mais importantes. Fiquem em casa — conta uma funcionária, sem se identificar.
Abertura de quase 400 leitos no Rio
Na última sexta-feira (4), o governador em exercício Claudio Castro e o prefeito Marcelo Crivella anunciaram as medidas tomadas para tentar conter o avanço da Covid-19. Ambos destacaram a abertura de novos leitos exclusivos e fiscalização mais rigorosa como soluções capazes de frear a curva de contágio no Rio de Janeiro.
No mesmo evento, a Secretaria estadual anunciou a abertura de 386 leitos, sendo 314 de UTI. Já Marcelo Crivella disse que no município serão abertos 170 leitos de enfermaria nos próximos 15 dias e outros 50 de UTI, sendo 20 desses por semana.
— Dentro do atual cenário, a promessa de abertura de novos leitos é o aspecto que podemos considerar como o mais positivo — avalia Vasconcelos, do SinMed Rio.
A secretaria municipal de Saúde destaca que "as pessoas que aguardam leitos de UTI estão sendo assistidas em leitos de unidades, com monitores e respiradores".