A nova subvariante XE da Ômicron – resultado de uma recombinação entre as sublinhagens BA.1 e a BA.2 e potencialmente mais transmissível– foi detectada no Brasil. O caso é de um homem, de 39 anos, morador da cidade de São Paulo, e foi identificado a partir do sequenciamento genético realizado pelo Instituto Butantan. Especialistas ouvidos pelo GLOBO, no entanto, ressaltam que a XE não parece oferecer riscos para uma nova onda da Covid-19 no Brasil e reforçam que as vacinas atuais devem continuar protegendo contra desfechos graves da doença.
O caso é de uma amostra coletada no dia 7 de março e veio de fora do país, mostra laudo do Butantan ao qual o GLOBO teve acesso. Os sintomas começaram em 17 de fevereiro, e o homem já está recuperado. A nova subvariante foi detectada pela primeira vez no dia 19 de janeiro no Reino Unido e, de acordo com a última atualização da autoridade de saúde do país, foram detectados 637 casos até agora.
— Isso é esperado, vão continuar aparecendo variantes todos os dias. É importante a gente monitorar do ponto de vista epidemiológico, mas a maioria não é de preocupação e é improvável que vá surgir uma variante, ou subvariante, agora que provoque uma nova onda como as anteriores — explica o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Alberto Chebabo.
Ele destaca que quanto maior a transmissão da Covid-19, maiores são as chances de novas variantes surgirem, por isso a importância de se ampliar a cobertura vacinal em âmbito mundial. Porém, até que tenham a capacidade de substituir a cepa predominante, as novas mutações não representam grandes riscos para uma nova onda da doença.
— Só vai se tornar o que a OMS classifica como uma variante de preocupação se ela causar um quadro mais grave, com mais riscos, ou se ela conseguir substituir as que circulam hoje, no caso a BA.1 e a BA.2. Mas, mesmo se for o caso, isso não significa que uma nova onde teria uma proporção ou gravidade como as anteriores, a gente está falando hoje de um mundo com vacina em que grande parte da população está imunizada — acrescenta o infectologista.
Além disso, os especialistas reforçam que a XE é uma recombinação de duas subvariantes da Ômicron já conhecidas, então não se trata de uma nova mutação que pode atuar de forma inesperada. Em sua última atualização do boletim epidemiológico, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu que dados iniciais indicam uma transmissibilidade 10% maior da XE, mas ressalta que ela “pertence à variante Ômicron até que diferenças significativas na transmissão e nas características da doença, incluindo gravidade, possam ser relatadas”.
A consultora médica chefe da Agência de Segurança de Saúde do país (UKHSA), Susan Hopkins, afirmou também, em comunicado, que embora suponha-se que a XE seja 10% mais transmissível, “ainda não podemos confirmar se ela tem uma verdadeira vantagem de crescimento”.
— Se de fato for 10% mais transmissível por semana, demoraria muito para ela se sobrepor a uma variante que é predominante. Aqui no Brasil, esse cálculo ficaria ainda mais difícil de ser feito porque foi só um único caso da XE detectado até agora. Então não conseguimos falar nem da porcentagem que ele representa dos casos totais ainda — destaca o geneticista Salmo Raskin, diretor do Laboratório Genetika, de Curitiba.
Eficácia das vacinas
Para a imunologista e doutora em Biociências e Fisiopatologia, Letícia Sarturi, embora ainda não tenham estudos sobre a eficácia das vacinas especificamente contra a subvariante XE, os dados relativos à Ômicron indicam que elas continuarão protegendo especialmente contra desfechos graves da Covid-19.
Leia Também
— Esta subvariante ainda é a Ômicron, e se tratando dela a gente já sabe que as precauções que devem ser tomadas são as mesmas e que as vacinas seguem funcionando. Nós não temos variantes hoje que não sejam suscetíveis às vacinas — afirma a especialista.
Ela explica que os imunizantes atuam com diversas partes da proteína Spike do Sars-CoV-2 – vírus causador da Covid-19 – estimulando uma resposta imune. Parte dessa reação, que envolve a produção de anticorpos, pode ser reduzida com as mutações, o que enfraquece a proteção contra infecção.
Mas, outra parte, que é mais ampla e envolve as células de defesa, como os linfócitos T, continua ativa mesmo com algumas variações. Essa parte é essencial para impedir a progressão da doença para formas mais graves, explica Letícia.
— Por isso, é preciso uma mutação muito grande na proteína para que você perca a eficácia dessa imunidade celular. Não é o que temos. As variantes até então tem mutações na proteína, muitas que provocaram uma certa evasão imune principalmente dos anticorpos, mas, em relação aos linfócitos, a proteção conferida pelas vacinas continuou eficaz — afirma a imunologista.
Futuro da pandemia
Letícia destaca que as recombinações acendem um alerta porque mostram uma persistência do vírus na natureza, mas que não devem provocar uma reação alarmista na população geral. Tanto ela, como Chebabo acreditam que não há um risco iminente de uma nova onda da Covid-19 no Brasil, ao menos na gravidade das anteriores em relação aos óbitos.
Para o presidente da SBI, o fundamental, no momento, é que o país amplie a cobertura vacinal com a dose de reforço e, para os mais vulneráveis, com a quarta dose. Ele explica que isso é natural, uma vez que imunossuprimidos e idosos, por exemplo, têm uma resposta mais fraca às vacinas.
Como estratégia para os próximos meses, Chebabo também reforça a importância de se adquirir medicamentos comprovadamente eficazes contra a Covid-19, como o Paxlovid, antiviral desenvolvido pela Pfizer que foi aprovado pela Anvisa no último mês.
— É importante que o governo adquira os remédios com critérios para utilização na saúde pública, tanto o Paxlovid, como os anticorpos monoclonais para os indivíduos imunossuprimidos. São grupos que respondem mal no geral à resposta das vacinas, não só de Covid-19, então é preciso investir nessas alternativas — afirma o infectologista.