Surtos de sarampo não são exclusividades do Brasil. Na Europa, mais de 41 mil pessoas foram infectadas pelo vírus nos primeiros seis meses deste ano, segundo alerta emitido nesta segunda-feira (20) pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
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Ao menos sete países europeus já registram mais de mil casos de sarampo entre crianças e adultos este ano, conforme divulgou a OMS. Entre eles estão França, Geórgia, Grécia, Itália, Rússia, Sérvia e Ucrânia.
Ao todo, considerando todo o continente, o número ultrapassa o saldo registrado ao longo de 12 meses em todos os últimos anos desta década. Até então, o maior número de casos entre 2010 e 2017 havia sido identificado no ano passado, quando foram contabilizadas 23.927 infecções. Os dados mostram ainda que pelo menos 37 pessoas morreram este ano por causa da doença.
Apenas na Ucrânia, mais de 23 mil pessoas foram afetadas pela doença, o que representa mais da metade do total de casos identificados no continente. Mortes relacionadas ao sarampo, segundo a entidade, foram reportadas em todos esses sete países, com a Sérvia respondendo pelo número mais alto: 14 até o momento.
“Estamos observando um aumento dramático nas infecções e surtos prolongados”, destacou a diretora regional da OMS para a Europa, Zsuzsanna Jakab. “Pedimos a todos os países que implementem imediatamente medidas amplas e adequadas ao contexto para impedir uma maior disseminação dessa doença”, acrescentou, ao citar a importância de programas de imunização contra o sarampo.
A organização reforçou que o vírus do sarampo é excepcionalmente contagioso e se espalha facilmente entre indivíduos suscetíveis. A orientação para prevenir surtos é manter, todos os anos, uma cobertura vacinal de pelo menos 95% utilizando duas doses da vacina contra a doença, com esforços especiais para identificar crianças, adolescentes e adultos que não foram imunizados no passado.
Situação do sarampo no Brasil
Atualmente, o País enfrenta dois surtos de sarampo , em Roraima e Amazonas, conforme informações do Ministério da Saúde. Até o dia 14 de agosto, data da divulgação do último boletim epidemiológico, foram confirmados 910 casos da doença no Amazonas, sendo que 5.630 permanecem em investigação. Já em Roraima, foram 296 casos registrados e 101 estão sob suspeita.
Os surtos estão relacionados à importação, já que o genótipo do vírus (D8) que está circulando no país é o mesmo que circula na Venezuela, que enfrenta um surto da doença desde 2017.
Casos isolados, relacionados à importação, também foram identificados em São Paulo (1), Rio de Janeiro (14); Rio Grande do Sul (13); Rondônia (1) e Pará (2). As medidas de bloqueio de vacinação, mesmo em casos suspeitos, estão sendo realizadas em todos os estados.
Até o momento, foram confirmados seis óbitos por sarampo, sendo quatro em Roraima (três em estrangeiros e um em brasileiro) e dois no Amazonas (brasileiros).
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Por que o sarampo voltou?
A condição, que já foi uma das principais causas de mortalidade infantil por aqui e pode deixar sequelas neurológicas graves, é altamente contagiosa, já que a transmissão ocorre diretamente, de pessoa para pessoa, por meio de tosse, espirros, fala ou respiração.
Contudo, não é justo atribuir toda a culpa do retorno da doença à imigração, conforme pontua o segundo secretário da Sociedade Brasileira de Imunização (SBIm) Juarez Cunha. O surto poderia ter sido controlado com a vacina , disponível gratuitamente na rede pública.
"Além da situação na Venezuela, o sarampo já tinha surtos registrados na Europa desde 2016. Com as quedas das coberturas vacinais e com doenças já eliminadas se aproximando do Brasil, o risco de surtos fica muito maior”, disse.
Segundo o ministério, a meta de vacinação contra o sarampo, que é de 95% do público-alvo, não foi atingida nos últimos anos de campanha. Dados preliminares referentes ao ano passado indicam que a cobertura no Brasil foi de 85,21% na primeira dose (tríplice viral) e de 69,95% na segunda dose (tetra viral).
Parte do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde, duas vacinas compõem a proteção contra a infecção. A mais comum é a Tríplice Viral , que protege ainda contra rubéola e caxumba. Mas o Sistema Único de Saúde também disponibiliza a Tetra Viral, que fornece proteção adicional contra a varicela.
Para Renato Kfouri, presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), apesar de não haver nenhum estudo com precisão que defina o que ocasionou a volta dos casos da condição neste ano, a falsa sensação de tranquilidade que paira sobre a população desde a eliminação da circulação do vírus teve forte colaboração para a queda de adesão à proteção.
“O desaparecimento das doenças desestimula a procura por vacinas, que é regida pela quantidade de casos notificados da condição. Sabemos que o ser humano procura a prevenção apenas quando se sente sob risco. Quando isso acontece, as vacinas fazem sucesso, a doença é eliminada e a percepção de risco acaba, tanto para população em geral, quanto para os profissionais da saúde”, analisa Kfouri.
Outros fatores que também podem ter colaborado com a baixa procura pela imunização é a dificuldade do acesso às doses. Além da falta de abastecimento em muitos postos de saúde, os horários das unidades não são flexíveis. “Não atendem às mães que trabalham, por exemplo. O acesso fica dificultado, ainda mais porque os postos não abrem de sábado”, apontou o especialista da SBP.
Cunha acrescenta outro ponto de vista ao problema: a disseminação de notícias falsas, principalmente nas redes sociais. “Qualquer divulgação de notícia falsa ou caso isolado de reações adversas à vacina, por exemplo, coloca em risco a credibilidade do imunizante. As pessoas não conseguem diferenciar os riscos da doença natural e o risco da vacina. Assim todo o lado positivo da imunização fica ameaçado”, considera.
A orientação do Ministério da Saúde, da SBP e da SBIm para combater a doença é para que a população se vacine. Em todo o País está acontecendo a Campanha Nacional de Vacinação contra Sarampo e Poliomielite, que vai até dia 31 de agosto e vai vacinar todas as crianças entre 1 e menores do que 5 anos, mesmo as que já receberam as doses.
Para tirar as dúvidas sobre qual vacina tomar e quem deve receber a proteção, veja a lista abaixo.
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O sarampo voltou?
Sim. De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), o Brasil vive um surto da doença, concentrado em Roraima e Amazonas, mas há dois casos confirmados no Rio de Janeiro, sete no Rio Grande do Sul, dois no Mato Grosso e um em São Paulo.
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Como posso me proteger?
A maneira mais eficaz de manter a população imune é a vacinação. Por isso, a meta do Ministério da Saúde é imunizar 95% da população de 12 meses a 49 anos.
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Outras medidas que podem ser tomadas para evitar a contaminação são: higienizar as mãos sempre antes de tocar olhos, boca e nariz, antes das refeições, e evitar espirrar e tossir nas mãos.
A circulação do vírus costuma ser maior em ambientes fechados e aglomerados, que devem ser evitados por quem não recebeu a proteção.
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Há mais de uma vacina que protege contra a doença? As duas estão disponíveis na rede pública?
Sim. Se seguir a rotina do Programa Nacional de Imunizações, crianças de 12 meses a menores de 5 anos de idade recebem uma dose da tríplice viral aos 12 meses e depois outra aos 15 meses de idade da tetra viral. Ambas estão disponíveis gratuitamente nos postos de saúde.
Já as crianças de 5 anos a 9 anos de idade que perderam a oportunidade de serem vacinadas anteriormente acabam recebendo duas doses da vacina tríplice viral, com um intervalo de um a dois meses.
Para quem foi vacinado, o segundo secretário da SBIm faz um alerta: “Até o ano 2000 se fazia a vacina em crianças de 9 meses. Mas o ideal é que a criança seja imunizada após os 12 meses, ou seja, quem foi protegido antes de 1 ano de idade deve buscar a vacina na rede pública, pois não é considerado adequadamente imune”.
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Adultos que não se lembram ou não têm certeza se tiveram sarampo precisam se vacinar?
Apesar de ser voltada para o público infantil, adultos e adolescentes que não receberam a vacina podem buscar a proteção nos postos de saúde gratuitamente. “Se a pessoa perdeu o comprovante da vacina e não tem certeza se tomou, o ideal é buscar a imunização. Não tem problema fazer doses a mais, caso a administração já tenha sido feita antes”, garante Juarez.
Para os adolescentes e adultos de até 49 anos há duas recomendações, segundo o Ministério da Saúde: pessoas de 10 a 29 anos devem receber duas doses da tríplice viral, enquanto pessoas de 30 a 49 anos só recebem uma dose da tríplice viral.
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Quem tem mais de 50 anos pode tomar a vacina?
Segundo o Ministério da Saúde, mesmo se a pessoa com mais de 50 anos não tenha certeza se tomou ou não a imunização, não há necessidade de recorrer à proteção.
“Entende-se que na infância dessas pessoas, como não tinha vacina, a chance delas terem tido a doença é grande, por isso não é preciso receber a dose. Porém, a SBIm recomenda a imunização, já que não dá para ter certeza se o indivíduo teve ou não a condição”, avalia Cunha.
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Quem já se vacinou precisa tomar reforço?
Não. Segundo o Ministério da Saúde, quem comprovar a vacinação contra o sarampo conforme preconizado para sua faixa etária, não precisa receber a vacina novamente.
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E quem já teve sarampo?
Também não. Indivíduos com história pregressa de sarampo, caxumba e rubéola são considerados imunizados contra as doenças, mas é preciso certeza do diagnóstico. Na dúvida, é melhor buscar a vacinação.
“Só não vai tomar a vacina quem tiver certeza que já foi vacinado ou teve a doença. E essa certeza é comprovada pelo comprovante na carteira vacinal ou exames que atestam sarampo. Se a pessoa não tiver, melhor ser imunizado. Só a história de que teve a doença ou recebeu a vacina não vale”, pontuou o especialista da SBIm.
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Bebês estão sob risco da doença?
Bebês de mães que foram vacinadas já nascem com os anticorpos necessários para proteção contra o sarampo, por isso a vacina não é necessária. No entanto, em casos excepcionais de surtos, há indicação de imunizar bebês de 6 meses. No momento, essa medida não é necessária.
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Gestantes podem se vacinar?
Não. A recomendação do Ministério da Saúde é que as grávidas devem esperar para serem vacinadas após o parto.
Para quem está se planejando engravidar, é ideal ter certeza de que está protegida. Nesses casos, um exame de sangue pode dizer se a pessoa já está imune à doença. Se não estiver, a vacina pode ser tomada um mês antes da gravidez.
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Há alguma contraindicação da vacina?
“Por se tratar de uma vacina atenuada, com vírus vivos enfraquecidos, imunodeprimidos não devem receber as doses”, aconselha Cunha.
Entende-se como imunodeprimidos aqueles que estejam com a imunidade comprometida seja por alguma doença ou medicação, como pessoas com câncer que estejam recebendo quimioterapia ou que vivem com o vírus HIV.
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Quais cuidados devo ter após a vacinação?
De acordo com a SBIm, qualquer sintoma grave ou inesperado após a imunização deve ser notificado ao serviço que realizou a administração da dose. Em caso de febre, a proteção deve ser adiada até que ocorra a melhora do indivíduo.
"Compressas frias aliviam a reação no local da aplicação. Sintomas de eventos adversos graves ou persistentes, que se prolongam por mais de 24 a 72 horas (dependendo do sintoma), devem ser investigados para verificação de outras causas", complementa.
O que é sarampo?
O sarampo é uma doença infecciosa aguda , de natureza viral, grave, transmissível e extremamente contagiosa. Complicações infecciosas contribuem para a gravidade do quadro, particularmente em crianças desnutridas e menores de um 1 ano de idade.
Os sintomas incluem febre alta acima de 38,5°C; erupções na pele; tosse; coriza; conjuntivite; e manchas brancas que aparecem na mucosa bucal, conhecidas como sinais de Koplik e que antecedem de um a dois dias antes do aparecimento da erupção cutânea.
A transmissão do vírus acontece de quatro a seis dias antes e até quatro dias após o aparecimento do exantema (erupção cutânea). O período de maior transmissibilidade ocorre dois dias antes e dois dias após o início da erupção cutânea.
Não há um tratamento específico para quem contrai a infecção. A orientação é que a pessoa receba a administração da vitamina A, a fim de reduzir a ocorrência de casos graves e fatais. O tratamento profilático com antibiótico é contraindicado, segundo o Ministério da Saúde.
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Para os casos sem complicação, o indicado é manter a hidratação, o suporte nutricional e diminuir a hipertermia. Muitas crianças necessitam de quatro a oito semanas para recuperar o estado nutricional que apresentavam antes do sarampo . Complicações como diarreia, pneumonia e otite média devem ser tratadas de acordo com normas e procedimentos estabelecidos pela pasta.