Brasil, em ritmo lento de vacinação, só tem doses garantidas para 65% da população
Divulgação/Governo do Estado de São Paulo
Brasil, em ritmo lento de vacinação, só tem doses garantidas para 65% da população

O Brasil ainda está longe de chegar à marca de 70% de sua população vacinada, estimada como um limiar mínimo para imunidade coletiva contra o novo coronavírus. Após 49 dias de campanha de vacinação em curso, apenas 3,75% da população (5% dos adultos) recebeu a primeira dose do imunizante. E, se forem consideradas apenas as vacinas com contrato fechado no Brasil, o país deve chegar a abril do ano que vem ainda sem atingir a taxa almejada de 70% de vacinados com duas doses.

A projeção é baseada em  cronograma de entrega de vacinas que o Ministério da Saúde divulgou nesta semana, levando em conta apenas os contratos já assinados e que já tenham data de entrega prevista de doses.

O governo federal está em tratativas com mais fabricantes de vacina e divulgou nesta semana os prazos propostos em negociações. Se esses contratos se concretizarem, o Brasil teria capacidade de atingir o limiar dos 70% ainda antes do fim do ano. Esse segundo cenário inclui vacinas da Pfizer , Janssen , Sputnik V e Moderna .

Essa perspectiva mais otimista requer também a confirmação de "compras futuras" que o ministério lista a serem efetuadas com a AstraZeneca e a Sinovac, que detêm, respectivamente, os royalties das vacinas que vêm sendo produzidas pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pelo Instituto Butantan, a partir de setembro.

A projeção feita pelo GLOBO levou em conta os períodos necessários de intervalos entre doses aprovados para cada vacina (no Brasil ou no exterior) e considerou uma capacidade de aplicação de 2 milhões de doses por dia no Brasil, que especialistas consideram exequível. Seria difícil chegar a um limiar de 70% antes de dezembro, porque, quando a maioria dos lotes de vacina estiverem chegando, o Programa Nacional de Imunização (PNI) possivelmente já estará operando com sua capacidade total, sem condições de aplicar as novas doses em tempo hábil.

Um dado preocupante é que o Brasil só tem compra de vacina contratada para imunizar 65% de sua população . O Ministério da Saúde divulgou o recebimento de 275 milhões de doses de vacinas para o Brasil, incluindo na conta as já entregues e aplicadas (apenas 1,23% da população já recebeu as duas doses da vacina). Outros 140 milhões de doses viriam pelas "compras futuras" com AstraZeneca e Sinovac, e mais 161 milhões são as doses ainda "em tratativas", segundo o cronograma do governo federal.

Se todos os negócios listados pela pasta se concretizarem, no ano que vem o Brasil já terá dose para vacinar 100% da população. Mas o ritmo atual de vacinação está lento, segundo especialistas, justamente por conta da falta de vacinas no sistema.

Segundo Denise Garrett, epidemiologista e vice-presidente do Instituto Sabin, o Brasil tem experiência e estrutura suficientes para ter mais agilidade, mesmo num cenário de escassez de doses.

"O Brasil conseguiu vacinar 80 milhões de pessoas, na campanha contra Influenza, em apenas três meses. São 38 mil salas de vacinação no país inteiro, com profissionais treinados. É inaceitável o que estamos vendo", afirma. "Faltam experiência e organização para lidar com esse tipo de campanha, que é realmente complicada".

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Desde o início da campanha de vacinação contra a Covid-19 , o Brasil deu a primeira dose do imunizante para, em média, 0,1% da sua população por dia. De acordo com o portal Our World in Data, da Universidade de Oxford, o ritmo de vacinação brasileiro fica bem abaixo do de outros países.

Cenário global

Os chilenos e americanos, por exemplo, vacinaram com pelo menos uma dose mais do que o dobro dessa parcela populacional (0,26% e 0,22%, respectivamente) diariamente. O Reino Unido tem quase o quádruplo (0,39%) de parcela da população imunizada por dia, e Israel, que ganhou destaque mundialmente na agilidade no processo, alcançou 0,77% da população vacinada por dia — um ritmo sete vezes maior do que o brasileiro.

O Chile, que tem a vacinação no estágio mais avançado da América Latina, conseguiu aplicar pelo menos uma dose em 20,4% da sua população (contra cerca de 4% do Brasil). Já os EUA imunizaram 16,2%, o Reino Unido está em 30,9% e Israel já tem a maior parte dos cidadãos com pelo menos uma dose da vacina contra Covid-19, com uma taxa de 56%. Todos esses países começaram, no entanto, suas campanhas quase um mês antes do Brasil.

O ex-presidente da Anvisa Gonzalo Vecina prevê aceleração da vacinação no país apenas no começo do segundo semestre, com a chegada maior de doses, caso se confirmem a previsão da Fiocruz e os acordos com a Pfizer e a Janssen, principalmente.

"Quando atingirmos um número de 45 milhões de doses disponíveis num mês, vamos atingir “velocidade de cruzeiro”. Chegando a vacina, espero que aconteça no Brasil um pouco do que está acontecendo na Escócia e Israel, onde o número de casos caiu consideravelmente", avalia.

Vecina e a vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Isabella Ballalai, entendem que o Brasil tem a infraestrutura e o material humano necessários para conseguir aumentar o ritmo de imunização quando as doses chegarem. Até lá, no entanto, a especialista recomenda se proteger do vírus seguindo os protocolos sanitários.

"Aconselho a só sair se necessário. A gente vive o pior momento da pandemia e está difícil as pessoas acreditarem nisso. Em agosto do ano passado, estávamos assustados e em casa com o número de casos que a gente tinha. E hoje temos muito mais. Parece que a percepção mudou. As pessoas perderam o medo de pegar", diz.

Segundo Isabella, o poder público no Brasil precisa manter as medidas de contenção do vírus e, enquanto a vacinação seguir, monitorar a pandemia.

Especialistas afirmam que ainda não há um consenso sobre quando a imunidade coletiva pode ser atingida a ponto de reduzir a pandemia por si só, e há fatores novos complicantes para se fazer essas estimativas, como as novas variedades do vírus que circulam no Brasil e em outros países.

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